Para começar, o texto é uma peça notável de oratória cristã. O fato é
por vezes ignorado: Luther King foi sobretudo influenciado por Thoreau e
Gandhi, dizem os especialistas, e a sua estratégia de resistência não
violenta é tributária dos dois.
Certo, certíssimo. Mas, antes de Thoreau e Gandhi, recordo aos
especialistas que Luther King foi formado na adolescência pelo teólogo
Benjamin Mays, que incutiu no pupilo uma ideia revolucionária e simples:
se os ensinamentos da Bíblia não servem para mudar os homens, então a
Bíblia serve para muito pouco.
Luther King aprendeu a lição: primeiro, ao tornar-se também teólogo e
pastor batista no Alabama. E, depois, ao aplicar o arsenal teológico à
causa dos direitos civis.
A cadência e o vigor retórico de Luther King são próprios de um pastor em frente ao seu rebanho.
texto completo em http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrada/126014-um-rei-em-washington.shtml
Crer não é sinônimo de não pensar. Crer implica em pensar, em relacionar fé com a realidade, questionando uma a partir da outra. O conteúdo são pensamentos às vezes rápidos, em elaboração; outros, já mais elaborados. Ambos buscando provocar discussão e reposicionamentos, partindo sempre da confissão de fé protestante. Os artigos classificados como "originais" podem ser reproduzidos desde que com a menção da fonte e autoria. Ano V
sexta-feira, 30 de agosto de 2013
quinta-feira, 29 de agosto de 2013
Eu tenho um sonho
Estou feliz em me unir a vocês hoje naquela que ficará para a história
como a maior manifestação pela liberdade na história de nossa nação.
Cem anos atrás, um grande americano, em cuja sombra simbólica nos
encontramos hoje, assinou a proclamação da emancipação [dos escravos].
Este decreto momentoso chegou como grande farol de esperança para
milhões de escravos negros queimados nas chamas da injustiça abrasadora.
Chegou como o raiar de um dia de alegria, pondo fim à longa noite de
cativeiro.
Mas, cem anos mais tarde, o negro ainda não está livre. Cem anos mais
tarde, a vida do negro ainda é duramente tolhida pelas algemas da
segregação e os grilhões da discriminação. Cem anos mais tarde, o negro
habita uma ilha solitária de pobreza, em meio ao vasto oceano de
prosperidade material. Cem anos mais tarde, o negro continua a mofar nos
cantos da sociedade americana, como exilado em sua própria terra. Então
viemos aqui hoje para dramatizar uma situação hedionda.
Em certo sentido, viemos à capital de nossa nação para sacar um cheque.
Quando os arquitetos de nossa república redigiram as magníficas palavras
da Constituição e da Declaração de Independência, assinaram uma nota
promissória de que todo americano seria herdeiro. Essa nota era a
promessa de que todos os homens, negros ou brancos, teriam garantidos os
direitos inalienáveis à vida, à liberdade e à busca pela felicidade.
É evidente hoje que a América não pagou esta nota promissória no que diz
respeito a seus cidadãos de cor. Em lugar de honrar essa obrigação
sagrada, a América deu ao povo negro um cheque que voltou marcado "sem
fundos".
Mas nós nos recusamos a acreditar que o Banco da Justiça esteja falido.
Nos recusamos a acreditar que não haja fundos suficientes nos grandes
depósitos de oportunidade desta nação. Por isso voltamos aqui para
cobrar este cheque --um cheque que nos garantirá, a pedido, as riquezas
da liberdade e a segurança da justiça.
Também viemos para este lugar santificado para lembrar à América da
urgência ferrenha do agora. Não é hora de se dar ao luxo de esfriar os
ânimos ou tomar a droga tranquilizante do gradualismo. Agora é a hora de
fazermos promessas reais de democracia. Agora é a hora de sairmos do
vale escuro e desolado da segregação para o caminho ensolarado da
justiça racial. É hora de arrancar nossa nação da areia movediça da
injustiça racial e levá-la para a rocha sólida da fraternidade. Agora é a
hora de fazer da justiça uma realidade para todos os filhos de Deus.
Seria fatal para a nação passar por cima da urgência do momento e
subestimar a determinação do negro. Este verão sufocante da insatisfação
legítima do negro não passará enquanto não chegar um outono revigorante
de liberdade e igualdade. 1963 não é um fim, mas um começo.
Os que esperam que o negro precisasse apenas extravasar e agora ficará
contente terão um despertar rude se a nação voltar à normalidade de
sempre. Não haverá descanso nem tranquilidade na América até que o negro
receba seus direitos de cidadania. Os turbilhões da revolta continuarão
a abalar as fundações de nossa nação até raiar o dia iluminado da
justiça.
Mas há algo que preciso dizer a meu povo posicionado no morno limiar que
conduz ao palácio da justiça. No processo de conquistar nosso lugar de
direito, não devemos ser culpados de atos errados. Não tentemos saciar
nossa sede de liberdade bebendo do cálice da amargura e do ódio.
Temos de conduzir nossa luta para sempre no alto plano da dignidade e da
disciplina. Não devemos deixar nosso protesto criativo degenerar em
violência física. Precisamos nos erguer sempre e mais uma vez à altura
majestosa de combater a força física com a força da alma.
A nova e maravilhosa militância que tomou conta da comunidade negra não
deve nos levar a suspeitar de todas as pessoas brancas, pois muitos de
nossos irmãos, conforme evidenciado por sua presença aqui hoje, acabaram
por entender que seu destino está vinculado ao nosso destino e que a
liberdade deles está vinculada indissociavelmente à nossa liberdade.
Não poderemos caminhar sozinhos.
E, enquanto caminhamos, precisamos fazer a promessa de que caminharemos
para frente. Não poderemos retroceder. Há quem esteja perguntando aos
devotos dos direitos civis: Quando vocês ficarão satisfeitos?'. Jamais
estaremos satisfeitos enquanto o negro continuar sendo vítima dos
desprezíveis horrores da brutalidade policial.
Jamais estaremos satisfeitos enquanto nossos corpos, pesados da fadiga
de viagem, não puderem hospedar-se nos hotéis de beira de estrada e nos
hotéis das cidades. Não estaremos satisfeitos enquanto a mobilidade
básica do negro for apenas de um gueto menor para um maior. Jamais
estaremos satisfeitos enquanto nossas crianças tiverem suas
individualidades e dignidades roubadas por cartazes que dizem exclusivo
para brancos'.
Jamais estaremos satisfeitos enquanto um negro no Mississippi não puder
votar e um negro em Nova York acreditar que não tem nada em que votar.
Não, não estamos satisfeitos e só ficaremos satisfeitos quando a justiça
rolar como água e a retidão correr como um rio poderoso.
Sei que alguns de vocês aqui estão, vindos de grandes provações e
atribulações. Alguns vieram diretamente de celas estreitas. Alguns
vieram de áreas onde sua busca pela liberdade os deixou feridos pelas
tempestades da perseguição e marcados pelos ventos da brutalidade
policial. Vocês têm sido os veteranos do sofrimento criativo. Continuem a
trabalhar com a fé de que o sofrimento imerecido é redentor.
Voltem ao Mississippi, voltem ao Alabama, voltem à Carolina do Sul,
voltem à Geórgia, voltem à Louisiana, voltem aos guetos e favelas de
nossas cidades do norte, cientes de que de alguma maneira a situação
pode ser mudada e o será. Não nos deixemos atolar no vale do desespero.
Digo a vocês hoje, meus amigos, que, apesar das dificuldades de hoje e de amanhã, ainda tenho um sonho.
É um sonho profundamente enraizado no sonho americano.
Eu tenho um sonho de que um dia esta nação se erguerá e corresponderá em
realidade o verdadeiro significado de seu credo: Consideramos essas
verdades manifestas: que todos os homens são criados iguais'.
Tenho um sonho de que um dia, nas colinas vermelhas da Geórgia, os
filhos de ex-escravos e os filhos de ex-donos de escravos poderão
sentar-se juntos à mesa da irmandade.
Tenho um sonho de que um dia até o Estado do Mississippi, um Estado
desértico que sufoca no calor da injustiça e da opressão, será
transformado em um oásis de liberdade e de justiça.
Tenho um sonho de que meus quatro filhos viverão um dia em uma nação
onde não serão julgados pela cor de sua pele, mas pelo teor de seu
caráter.
Tenho um sonho hoje.
Tenho um sonho de que um dia o Estado do Alabama, cujo governador hoje
tem os lábios pingando palavras de rejeição e anulação, será
transformado numa situação em que meninos negros e meninas negras
poderão dar as mãos a meninos brancos e meninas brancas e caminharem
juntos, como irmãs e irmãos.
Tenho um sonho hoje.
Tenho um sonho de que um dia cada vale será elevado, cada colina e
montanha será nivelada, os lugares acidentados serão aplainados, os
lugares tortos serão endireitados, a glória do Senhor será revelada e
todos os seres a enxergarão juntos.
Essa é nossa esperança. Essa é a fé com a qual retorno ao Sul. Com esta
fé poderemos talhar da montanha do desespero uma pedra de esperança. Com
esta fé poderemos transformar os acordes dissonantes de nossa nação
numa bela sinfonia de fraternidade. Com esta fé podemos trabalhar
juntos, orar juntos, lutar juntos, ir à cadeia juntos, defender a
liberdade juntos, conscientes de que seremos livres um dia.
Esse será o dia em que todos os filhos de Deus poderão cantar com novo
significado:"["Meu país, é de ti, doce terra da liberdade, é de ti que
canto. Terra em que morreram meus pais, terra do orgulho do peregrino,
que a liberdade ressoe de cada encosta de montanha".
E, se quisermos que a América seja uma grande nação, isso precisa se tornar realidade.
Então que a liberdade ressoe dos prodigiosos picos de New Hampshire.
Que a liberdade ecoe das majestosas montanhas de Nova York!
Que a liberdade ecoe dos elevados Alleghenies da Pensilvânia!
Que a liberdade ecoe das Nevadas Rochosas do Colorado!
Que a liberdade ecoe das suaves encostas da Califórnia!
Mas não só isso --que a liberdade ecoe da Montanha de Pedra da Geórgia!
Que a liberdade ecoe da Montanha Sentinela do Tennessee!
Que a liberdade ecoe de cada monte e montículo do Mississippi. De cada encosta de montanha, que a liberdade ecoe.
E quando isso acontecer, quando deixarmos a liberdade ecoar, quando a
deixarmos ressoar em cada vila e vilarejo, em cada Estado e cada cidade,
poderemos trazer para mais perto o dia que todos os filhos de Deus,
negros e brancos, judeus e gentios, protestante e católicos, poderão se
dar as mãos e cantar, nas palavras da velha canção negra, "livres,
enfim! Livres, enfim! "Louvado seja Deus Todo-Poderoso. Estamos livres,
enfim!"
Martin Luther King, 28/08/63
quarta-feira, 28 de agosto de 2013
Painel sobre paternidade afetiva e paternidade biológica
Especialistas discutem principais desafios jurídicos, médicos e éticos que os avanços para determinar origem genética trazem para a questão da filiação
Uma série de avanços no campo da genética tem trazido questões complexas para a sociedade, a área médica e o judiciário, como as que envolvem a paternidade afetiva e a paternidade biológica.
No judiciário, a genética, que passou a ser uma via de responsabilização importada de outras áreas do Direito Civil para proteção da criança, começa agora a ser evocada pelos próprios filhos ou outros envolvidos, para “desamparar” esses pais afetivos em casos de adoção, reprodução assistida, ou mesmo filhos concebidos fora do matrimônio, mas reconhecidos pelos cônjuges no âmbito de uma família.
Essa questão será tema de um painel promovido pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) com renomados profissionais durante o IV Congresso Brasileiro de Direito Médico, dias 28 e 29 de agosto de 2013, em Brasília (DF). Participam a ministra do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Nancy Andrighi; o desembargador federal Roger Raupp Rios; e a professora da Universidade de Brasília (UnB), Débora Diniz.
O mediador desse debate (que acontece no segundo dia do evento, às 10h), procurador de Justiça do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), Diaulas Costa Ribeiro, explica que “a ideia da paternidade biológica foi criada para proteger a criança, atribuir responsabilidade, que é objetiva dos pais, sem nenhuma chance de discutir se queriam ou não o filho. Era a solução para amparar os mais fracos. Hoje, essa regra geral está sendo evocada por filhos já criados (ou outros envolvidos), que, por razões das mais diversas, começam a rejeitar a parentalidade afetiva e requerer a biológica”.
Um caso notório é o de dois irmãos que brigam na Justiça pelo direito a parte da herança do fundador da rede de joalherias H. Stern. O entendimento que prevaleceu nesse caso (na primeira instância, na segunda instância, e no STJ) é o de que o exame de DNA não pode autorizar a mudança no registro de nascimento deles (e o consequente direito à herança), dada a relação de afeto com o pai (socioafetivo) responsável pela criação dos dois no âmbito de uma outra família.
A questão, no entanto, é polêmica, está longe de ser esgotada e tem repercussões importantes para a relação médico-paciente (crianças originadas por algumas técnicas de reprodução assistida que requerem acesso a prontuários para descobrir sua ascendência biológica), para a sociedade (desamparo de pais afetivos), jurídica (direitos sucessórios), éticas (sigilo médico) etc.
Acompanhe esse debate no IV Congresso Brasileiro de Direito Médico do Conselho Federal de Medicina e saiba a opinião de especialistas sobre o que vai prevalecer nesse mundo da parentalidade.
Outros debates – O IV Congresso Brasileiro de Direito Médico será uma oportunidade para profissionais vinculados às áreas da medicina, do direito, da bioética, da justiça, procuradorias federais, procuradorias da república e Ministério Público debaterem perspectivas e experiências sobre temas como judicialização da saúde, direito do consumidor na relação médico-paciente, confidencialidade, testamentos vitais, paternidade afetiva versus paternidade biológica, reforma do sistema de saúde em Portugal e responsabilidade do diagnóstico em Psiquiatria Forense. Organizado pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), o evento acontece no Auditório JK da Procuradoria Geral da República, em Brasília (DF). “O nosso objetivo é promover o diálogo científico, interdisciplinar e profissional sobre importantes questões do Direito Médico que afetam as práticas médica, jurídica e social”, relata o 1º vice-presidente do CFM, Carlos Vital, coordenador da Comissão de Direito Médico, responsável pela organização do evento.
Serviço:
IV Congresso Brasileiro de Direito Médico
Data: 28 e 29 de agosto de 2013
Local: Auditório JK da Procuradoria-Geral da República (PGR), SAF Sul, Quadra 4, Conjunto C, Bloco C, Brasília (DF)
Inscrições e programação: http://www.eventos.cfm.org.br/
Informações à imprensa: (61) 3445-5940 imprensa@portalmedico.org.br
quarta-feira, 7 de agosto de 2013
Psicólogo identifica estruturas religiosas escondidas no pensamento freudiano
Seria possível identificar alguma religiosidade em Freud? A resposta mais óbvia é não. Mas o psicólogo José Calderoni pensa diferente. E vale a pena ler o que ele diz em seu livro "Descobrindo o Impensado: a Religiosidade do Ateu Freud (e de Cada Um?!)", da Escuta.
Apesar do título ser pouco claro, o livro em si é bem escrito, com aquele tom comum em bons autores terapeutas preocupados com a clínica: uma escrita solta, nada presunçosa, mas consistente.
A ideia de Calderoni parte da afirmação do filósofo Walter Rehfeld: existem estruturas de consciência religiosa na filosofia mesmo em autores claramente não religiosos ou ateus, como Freud. Daí, ele segue para a obra freudiana a fim de nela identificar indícios dessas estruturas.
continuar lendo na página da Folha de S Paulo
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