quarta-feira, 13 de março de 2013

Doação de órgãos, transplante de órgãos e a ética bíblico-cristã

Eduardo Ribeiro Mundim


Doação/transplante de órgãos pode ser realizada através de um doador vivo, ou falecido. Constitui-se uma forma última (no sentido de não existir alternativa melhor) para tratamento de diversas doenças, que têm como ponto comum a possibilidade de levar a pessoa doente à morte em um intervalo de tempo menor do que poderia ser.

O tratamento da pessoa doente tem pelo menos um de dois objetivos: aliviar um sofrimento (seja agudo ou crônico) e adiar a morte quando possível.

Habitualmente a função do transplante (e a transfusão de sangue é um transplante de órgãos) é postergar uma morte que pode ser adiada. Sua realização ética pressupõe uma série de aspectos a serem observados. E dentre inúmeros, há a imperiosa necessidade, por respeito ao doador, que a pessoa receptora tem de estar em estado de saúde tal que sua vida seja eficazmente prolongada - moribundos não são candidatos a receptores!

Ao tratar uma pneumonia em um idoso com antibiótico evita-se um óbito na grande maioria das vezes. Seria ético não tratar? Pode ser pensado que a morte nada é, que o cristão não a teme (e talvez a deseje, como Paulo chegou a escrever) - neste caso, o cristão não deveria procurar tratar a sua saúde, nem minorar o seu sofrimento, pois tudo está sob a soberana supervisão de Deus. É possível subscrever este raciocínio?

Onde está a indignidade da morte quando os recursos tecnológicos disponíveis são utilizados de forma ética e responsável? Conheço situações de absoluta conduta ética até aquelas de imperdoável obstinação terapêutica. Desconheço estudo que mostre qual é o que predomina, mas minha vivência como profissional de saúde desde 1986 percebe ser muito maior a preocupação pelo correto proceder que pela insistência desumana.

É lícito e necessário discutir-se o que significa "morte cerebral" - termo ou situação sobre a qual as Escrituras dizem absolutamente nada.

Sim, somos humanos, e lá no fundo, se estamos na fila de transplante de coração ou córnea (que exigem doador morto) há alegria na morte de alguém quando serei beneficiado. Vamos seriamente nos atrever a julgar a complexidade de sentimentos nesta circunstância? Vamos seriamente condenar tal pessoa por vivenciar estes sentimentos de uma forma frequentemente carregada de culpa?

O transplante eticamente realizado é a celebração da vida sobre a morte, é a morte de um prolongando a vida de outro. Ou, se preferir, tirando a frase do seu contexto, "ninguém tem maior amor do que este, de dar alguém a sua vida pelos seus amigos".

As distorções existentes, como parece haver no Hospital Evangélico (note bem, evangélico) de Curitiba, não podem ser toleradas, incentivadas ou deixadas sem punição. O não respeito à vontade do falecido por parte da família, que em vida expressou claramente seu desejo de ser doador, também não poderia ser tolerado, incentivado ou tratado com naturalidade.

A não doação de órgãos viáveis, para pessoas corretamente identificadas como receptoras, obedecendo aos critérios públicos de prioridade (ou "fila", se preferir), é que se constitui uma negação dos princípios básicos do Evangelho: doar vida para que o próximo viva, para que o fraco seja fortalecido. Sem esquecer que sempre que um recurso bolado por nós beneficia alguém, principalmente de forma ética, o Nome do Senhor é engrandecido, Sua graça comum distribuída, Seu amor insondável e misterioso proclamado.

Não é possível suportar o assassinato como forma de angariar órgãos; não é possível suportar pastores que não proclamam o perdão dos pecados pela cruz de Cristo, mas a via do enriquecimento fácil pelo suborno (?!) de Deus Pai.

Não é possível suportar quadrilhas que vituperam o correto exercício da medicina traficando órgãos; não é possível suportar políticos que são tão evangélicos quanto lobos, e que usam de um discurso fácil e raso para se manterem confortavelmente aboletados nos seus mandatos.

Não é possível enxergar no profissional médico um assassino serial frio e calculista (ainda que exista); não é possível enxergar no pastor e no missionário um falsário e um farsante (ainda que exista).

Por último, no meu país a baderna, a criminalidade generalizada e a corrupção deslavada e impune não são a tônica! Ou se o são, também assim é na Argentina, nos Estados Unidos, na Itália, na Grã-Bretanha, na Austrália, para citar apenas alguns.

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