Posted: 23 Feb 2016 10:15 AM PST
A   descoberta das ondas gravitacionais na semana passada foi aclamada como   o início de uma nova era na astrofísica. Estas vibrações no   espaço-tempo, que reivindicam a teoria da gravidade de Einstein cem anos   depois que ele a propôs pela primeira vez, nos permitem "ouvir" o   cosmos, bem como enxergá-lo.
Cientificamente falando, as ondas gravitacionais são uma nova forma   de experimentar nosso universo – e quem pode afirmar o que se irá   descobrir, ouvir e ver a partir de agora? Eu sou cristã e astrônoma,   então eu não tenho outra alternativa senão considerar o que isso   significa para a minha fé quando as fronteiras da ciência avançam de   maneira tão expressiva.
Muitos cristãos acham essa descoberta ameaçadora. Eles raciocinam da   seguinte forma: Se a ciência é capaz de explicar cada vez mais os   fenômenos do mundo natural, então haverá cada vez menos espaço no   cenário para Deus. O criacionismo é o exemplo mais conhecido dessa   lógica. Um criacionista acredita que a teoria da evolução é insidiosa   porque, à sua maneira de pensar, se aceitarmos a ideia de que a vida   surgiu a partir da "sopa primordial" e evoluiu para os seres humanos,   como podemos reivindicar que ela foi criada por um Criador divino?
Este tipo de raciocínio surge com tanta frequência que o apelidamos   de o "Deus das lacunas". Para os cristãos, o problema de raciocínio com o   "Deus-das-lacunas" é que ele coloca a ciência e a fé uma contra a   outra. Se aceitarmos a premissa de que as reivindicações da Bíblia devem   ser sopesadas contra as teorias científicas, então, inevitavelmente   tem-se que escolher uma e desprezar a outra. Como ocorrem as descobertas   científicas e as "lacunas" em nosso conhecimento científico   diminuem, precisamos cada vez menos da ideia de Deus para explicar o   mundo físico. Em uma batalha fé-contra-ciência, a fé está em desvantagem   – pela simples razão de que a ciência é muito eficiente para explicar   as coisas que vemos ao nosso redor.
Não é nenhuma surpresa, então, que apontar para o raciocínio   "Deus-das-lacunas" é uma tática favorita de Richard Dawkins e outros   críticos do cristianismo. Por outro lado, estudiosos cristãos reconhecem   que uma imagem como a que eu acabei de descrever não é uma teologia   muito robusta.
Ambos os lados parecem considerar insustentável qualquer filosofia   que se baseia em nossa falta de conhecimento para criar espaço para   Deus.
Não me interpretem mal, mas Deus não é útil enquanto uma teoria   científica. Pensar em Deus desta maneira foge do ponto. Toda a noção de   um Deus das lacunas depende de uma imagem filosófica em que a ciência   tem um ponto final. Por isso, quando descobrimos ondas gravitacionais,   ou encontramos um novo número primo, ou fazemos progressos em direção à   cura da doença crônica, nos aproximamos do "fim" [finalidade] da   ciência.
Esta é uma noção muito empobrecida do que é ciência, e eu ainda não   encontrei um cientista que pensa dessa maneira. A ciência diz respeito a   um processo de fazer perguntas. A tentativa de responder às nossas   perguntas sobre como as coisas funcionam leva a uma compreensão mais   profunda do mundo que nos rodeia, mas sempre levanta mais questões. A   ciência é uma resposta humana ao desconhecido – por isso, enquanto   houver humanos para fazer perguntas, nunca haverá um fim para a ciência.
Pela mesma razão, não devemos ter medo de abraçar o desconhecido – as   lacunas no nosso conhecimento do divino – como um caminho para a   compreensão de Deus. Na fé, assim como na ciência, fazendo perguntas   quando confrontados com o mistério é a natureza humana. É ingênuo pensar   que temos a capacidade de diminuir o poder, amor, ou o âmbito da ação   de Deus, simplesmente fazendo perguntas. Na verdade, eu defendo que um   espírito questionador deve desempenhar um papel importante na vida de fé   de um cristão. Longe de desencorajar o pedido, a Bíblia exorta: "Pedi, e   dar-se-vos-á; buscai, e achareis; batei e abrir-se-vos-á. Pois todo o   que pede, recebe; e quem busca, acha; e ao que bate, abrir-se-lhe-á.",   disse Jesus no Sermão da Montanha. [Mateus 7: 7-8]
Nossas perguntas assumem diferentes formas. Podemos usar nosso   raciocínio para sondar o universo físico que Deus criou. Podemos   desafiar a Deus por respostas em momentos de dor e tristeza; podemos ler   a Escritura e perguntar o que ela significa para as nossas vidas. É   claro que, em nenhum lugar ela nos garante respostas concretas. Mais   frequentemente do que um "não", Deus não dá respostas completas, mas em   vez disso ele responde com mais perguntas.
O Livro de Jó é uma exploração profunda deste questionamento   dinâmico. Quando Jó desafia Deus, exigindo uma explicação para suas   aflições, cada um de seus amigos oferece um raciocínio diferente. Quando   Deus o responde, varre ao longe suas respostas simplistas, e, ao invés   de uma resposta pronta, interroga Jó: "…porque te perguntarei, e tu me   responderás. Onde estavas tu, quando eu lançava os fundamentos da terra?   Faze-mo saber, se tens entendimento."[Jó 38: 3-4].
A narrativa da criação que se segue, sob a forma de perguntas   dirigidas a Jó, é uma das passagens mais impressionantes nas Escrituras.   Quando Deus concluiu, Jó realmente não teve uma resposta para a   pergunta original – Por que estou aflito? – Mas ele teve uma nova e mais   profunda compreensão de Deus.
"Eu te conhecia só de ouvir, mas agora os meus olhos te veem." [Jó 42: 5]
Nós já tínhamos visto o universo com a visão dos olhos, mas agora   nossos ouvidos o ouvem. Ondas gravitacionais levantam mais perguntas do   que respostas, mas sua descoberta nos dá uma maneira profunda de   compreender o cosmo que não tínhamos antes. Se temermos as lacunas em   nosso conhecimento, retrocedemos em fazer as perguntas que nos levam a   descobertas como essa, e perdemos a oportunidade de conhecer a Deus um   pouco melhor através da criação.
Jenna Freudenburg é astrônoma na Ohio State University.
Traduzido e adaptado por Áquila Mazzinghy.
 
 
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