segunda-feira, 25 de abril de 2011

Cruz abala entendimento de um Deus Todo Poderoso

Segunda-feira, 25 de abril de 2011 (ALC) - A morte de Cristo na cruz foi um choque para os primeiros cristãos, que tiveram dificuldade de aceitar o aparente fracasso do Deus que se revelava num Filho crucificado. Esse quadro abala a imagem de Deus Todo Poderoso, afirmou o teólogo suíço Daniel Marguerat, da Igreja Evangélica Reformada. 

Cristãos levaram quatro séculos e meio, tal a dificuldade de aceitação, para ousar representar a morte de Jesus na cruz, como registrada na pintura a óleo no portal de madeira da Basílica de Santa Sabina, em Roma, a mais antiga representação da crucificação que se tem notícia. 

"Essa representação tornou-se tão banal hoje para nós que esquecemos o fato de que, na verdade, a cruz era não somente o símbolo de uma morte, mas, sobretudo, o símbolo de uma execução extremamente cruel", disse o teólogo, que ministrou o curso "Ler Paulo hoje. Um estudo em diálogo com filósofos contemporâneos", nos dias da Quaresma, promovido pelo Instituto Humanitas, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), em São Leopoldo.

Tal como curiosos diante da crucificação de Jesus, no Gólgota, cristãos gostariam que Deus retirasse de forma mágica o seu Filho da cruz e o salvasse da morte. "No entanto, acontece o inverso: Deus se manifesta sob uma forma última e definitiva nesse momento em que o Filho está mais frágil", afirmou Marguerat.

Segundo o apóstolo Paulo, a revelação de Deus na cruz é um Deus que manifesta sua força de modo totalmente diferente daquele que as pessoas esperariam. A força, no mundo, é empregada, geralmente, para oprimir e afirmar autoridade dos que detêm o poder.

O teólogo suíço apontou para outra força, que é o da resistência, daquela pessoa que enfrenta uma doença e não se deixa destruir por ela, daquela pessoa que consegue se reerguer após um fracasso na vida, que sobrevive a um divórcio, a um câncer, a um fracasso profissional.

"Esta força é interior e não menos admirável ou, ao contrário, conviria dizer, esta força é realmente admirável ante o poder esmagador, hediondo e desumano", disse o professor emérito de Novo Testamento da Universidade de Lausanne em entrevista ao IHU. 

A partir da Sexta-Feira Santa, Deus se revela como aquele que luta com o frágil e o fraco para que a vida, a esperança e o amor triunfem sobre o que contraria sua humanidade. "É o Deus que ajuda o ser humano a permanecer humano no momento em que sua vida desfigura sua humanidade", disse.

A partir da cruz, Deus solidariza-se com aqueles que não têm valor na sociedade, "porque a realização da vida humana não depende daquilo que a sociedade estabelece como critério de êxito econômico, mas depende do valor atribuído a cada existência, da importância da compaixão, da atenção dispensada a cada ser humano."

Marguerat também destacou que a cruz não expressa o valor redentor do sofrimento, mas afirmou, ao contrário, que Deus, na existência em sofrimento, luta pela vida e solidariza-se com aquele que sofre para que ele possa resistir e fazer desse sofrimento um espaço de vida e não de morte.

"Se o sofrimento for proposto como ideal de vida, somente os masoquistas vão aderir a tal programa e, neste caso, precisam ser tratados. Mas o Evangelho não é isso. O dolorismo é que faz do sofrimento um ideal de vida. Jamais o Evangelho", frisou o teólogo suíço. 

Marguerat também admoestou a Igreja, que deveria questionar-se, a partir da cruz, sobre sua política de poder. "A cruz não é compatível com a busca de poder", afirmou, agregando: "É a Igreja a serviço dos pobres, a serviço do mundo, que pode tornar crível o seu discurso."
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