Crer não é sinônimo de não pensar. Crer implica em pensar, em relacionar fé com a realidade, questionando uma a partir da outra. O conteúdo são pensamentos às vezes rápidos, em elaboração; outros, já mais elaborados. Ambos buscando provocar discussão e reposicionamentos, partindo sempre da confissão de fé protestante. Os artigos classificados como "originais" podem ser reproduzidos desde que com a menção da fonte e autoria. Ano V
terça-feira, 31 de julho de 2012
Cientistas dizem que aves e até polvos têm alguma consciência
Neurocientistas de prestígio lançam manifesto reforçando evidências sobre consciência dos animais
Tecnologia permitiu ver que comportamentos afetivos e intencionais também acontecem nos bichos, diz o grupo
quais os impactos sobre a bioética (principalmente no campo de redução de sofrimento dos animais, e na defesa dos seus direitos)?
notícia completa em http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cienciasaude/56042-cientistas-dizem-que-aves-e-ate-polvos-tem-alguma-consciencia.shtml
domingo, 29 de julho de 2012
Quase três décadas após queda do regime militar povos indígenas ganham o seu AI-5, denuncia indigenista
Brasília, segunda-feira, 23 de julho de 2012 (ALC) - Mais uma vez o governo federal "dobra os joelhos" aos interesses do agronegócio e reza pela cartilha do capital, aponta nota do Conselho Indigenista Missionário (CIMI) questionando a portaria 303 da Advocacia Geral da União (AGU), publicada no Diário Oficial da União na terça-feira, 17.
A portaria prevê que "o usufruto das riquezas do solo, dos rios e dos lagos existentes nas terras indígenas pode ser relativizado sempre que houver relevante interesse público da União".
A norma contradiz acordos nacionais e internacionais assinados pelo Brasil, como a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que determina a realização de consulta prévia às comunidades indígenas sobre empreendimentos que interfiram em suas áreas.
O governo federal vem ao encontro do desejo da presidente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), senadora Katia Abreu, que, junto com a Federação da Agricultura e Pecuária do Mato Grosso do Sul (Famasul), sugeriu à AGU tal portaria, com o propósito de retirar do Poder Judiciário os processos demarcatórios e empoderar o próprio governo para tomar essas decisões.
O procurador do Estado do Mato Grosso do Sul, João Barcellos Lima, declarou que os estudos demarcatórios de terras indígenas precisam ser refeitos, com a participação do governo local, que "é preciso anular o que foi feito e começar do zero, refazendo os grupos técnicos".
Desconsiderar a existência de terras indígenas e começar do zero é tudo o que o agronegócio quer, interpretou o indigenista Egon Heck, do Cimi do Mato Grosso do Sul. "Essa portaria é o Ato Institucional número 5 dos povos indígenas", afirmou.
"Todo o trabalho realizado há vários anos e décadas será jogado na lata do lixo, pois o que querem fazer prevalecer sobre os direitos constitucionais são os interesses do grande capital nacional e internacional", denunciou Heck.
A AGU realizou entendimento próprio da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), de 2009, em que condicionou em 19 medidas a retirada de não-índios da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, localizada em Roraima. A portaria da AGU estende os efeitos da decisão do STF a todos os processo de demarcação de terras.
"O que assusta na portaria é o seu autoritarismo. A AGU está se antecipando ao STF e adotando uma interpretação reacionária das condicionantes", avaliou o representante do Instituto Socioambiental (ISA), Raul do Valle. "Tudo isso fundamentado num nebuloso conceito de segurança nacional, o mesmo que foi utilizado para perseguir os dissidentes da ditadura", agregou.
Heck lembrou que há 34 anos expirou o prazo legal para que todas as terras indígenas fossem demarcadas no Brasil, de acordo com o Estatuto do Índio. A lei não foi cumprida. "Não satisfeito em descumprir a legislação nacional e internacional no que diz respeito aos direitos indígenas, o governo dá um passo adiante", lastimou.
Em artigo para o sítio do Greenpeace, Nathália Clark destacou que graças às terras indígenas, cerca de 106 milhões de hectares estão hoje protegidos. A portaria da AGU acaba de abrir a porteira das terras indígenas para a construção de bases militares, rodovias, hidrelétricas e o resguardo das riquezas de cunho estratégico, sem precisar ouvir a comunidade indígena afetada.
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Agência Latino-Americana e Caribenha de Comunicação (ALC)
Edição em português: Rua Ernesto Silva, 83/301, 93042-740 - São Leopoldo - RS - Brasil
Tel. (+55) 51 3592 0416
quinta-feira, 12 de julho de 2012
A verdade sobre a condenação de Yousef Nadarkhani no Irã
Por Francisco Thiago Almeida, no Projeto 5
Você conhece este homem. Ele é Yousef Nadarkhani. Mas porque você o
conhece – ou deveria conhecê-lo? As notícias que circulam na Internet é
que Yousef é pastor e está sendo condenado à morte por ser cristão.
Minha intenção não apenas polemizar ou diminuir ainda a importância do
caso. Com certeza a firmeza e a fibra do Pastor Yousef são admiráveis!
Duvido que a metade dos cantores-pastores deste país teriam a mesma
coragem. E as reflexões que trarei aqui não pretendem diminuir a coragem
do pastor, pelo contrário, pretende criticar a nossa falta de coragem.
Agora veja esta imagem:
É nesta hora que você pergunta: Que diferença faz? E daí a gente pensa junto.
Abandonar o Islã: O Irã é um país – por falta de
palavra melhor no momento – confessional. Sua religião oficial é o Islã e
assim o país ainda absorve leis religiosas e as aplica com todo o rigor
que uma interpretação literalista do Corão pede: a chamada Sharia. Não
há, nestas leis, uma condenação exclusiva aos cristãos. Há sim uma lei
que proíbe-se o abandono do Islã. Yousef poderia ser espírita
kadercista, cadombléssista, budista, taioísta, seicho-no-ie-sista,
corinthiano que ele seria condenado à forca da mesma forma.
Rejeitasse Cristo: Aquela série “Deixados para trás” e
aquele filme antigo, dos idos dos anos 70 com o tema arrebatamento,
tiveram um grande impacto no cristianismo brasileiro. Há uma cena muito
forte onde, no tempo da tribulação, uma personagem é questionada se nega
ou não a Cristo enquanto sua cabeça está dentro de uma guilhotina – bem
retrô e impactante. Prova de que a teologia do martírio ainda é muito
forte entre nós. Não duvido que a forma como a notícia foi transmitida
pelos cristãos tenha sofrido influência desses filmes. Negar a Cristo? A
preocupação é que se negue a religião e volte para o Islã. Não há
porque negar a Cristo. Seria como pedir a um cristão que negue João
Batista!
Ajudar outras vítimas da Sharia: Não é apenas a “coisa”
religiosa que é digna de nota na imprensa internacional e entre
cristãos que anseiam pela expansão do reino de Deus. Há o abuso contra
as mulheres, contra crianças… Mas tudo isso demandaria “pensar”…
Discutir até que ponto a religião pode intervir no cotidiano das
pessoas, até que ponto a religião pode manipular as leis de um país,
obrigando que os compatriotas sigam forçadamente o comportamento
determinado por uma religião. Mas a maioria dos cristãos brasileiros não
querem fazer isso porque seria uma grande auto-crítica.
Outros fatos: Depois de todo o frisson causado
na internet, alguns grupos cristãos brasileiros retiraram seu apoio ao
Pr. Yousef pelo simples fato de ele não ser “trinitariano”. De mártir o
pastor passou a ser perseguido como herege. Isso me lembra o caso do “Suicida Cristão”.
Deste caso, eu tiro algumas conclusões:
A primeira é que os cristãos brasileiros não tem envergadura moral para
pedir o que estão pedindo. Primeiro porque é um pedido totalmente
egoísta e causuísta. Não querem libertar o Pr. Yousef porque é vítima de
intolerância religiosa. Querem libertar o Pr. Yousef porque ele é
cristão. E não é justo que um cristão morra… Se bem que, talvez alguns
até estejam pedindo para que ele morra… Um mártir é sempre bem vindo.
E a Igreja Cristã brasileira também não tem envergadura moral para pedir
o que está pedindo pelo simples fato de que aqui também caminha-se para
o mesmo rumo. O problema com o Irã não é ele seguir as leis do Islã; o
problema com o Irã é não seguir as leis do Cristianismo! E aí está: dois
pesos e duas medidas!
Os cristãos ainda preferem se colocar como vítimas para justificar o
gueto em que vivem. E uma vez no gueto, querem defender apenas aos seus.
Deveriam sim abrir os olhos e espalhar tantas mensagens de protesto por
conta das mulheres que são castradas, das crianças que são assassinadas
e exploradas, das leis abusivas e que vão contra os direitos humanos.
Mais uma vez digo: O problema não é com o Pr. Yousef: Um homem corajoso
e digno de nota. o problema é conosco que o utilizamos como ícone para
acusar o outro, mas não vemos que via de regra incorremos no mesmo erro.
Por um Estado Laico, contra todo tipo de intolerância e que me permita guiar a própria vida no caminho do respeito mútuo.
Via Pavablog
fonte: http://www.hermesfernandes.com/2012/06/verdade-sobre-condenacao-de-yousef.html
quarta-feira, 11 de julho de 2012
Holandesa que vive em BH acolhe menores há 20 anos e ensina prevenção contra Aids
Jefferson da Fonseca Coutinho - Estado de Minas
Publicação: 10/07/2012 06:00 Atualização: 10/07/2012 06:36
No início dos anos 1990, no Bairro Lagoinha, Região
Noroeste de Belo Horizonte, na esquina das ruas Além Paraíba e
Adalberto Ferraz, a presença constante de crianças e adolescentes
largados, sujos, delinquentes, chamava a atenção de moradores e
trabalhadores do entorno da Igreja Nossa Senhora da Conceição. Para a
maioria dos cristãos do quarteirão, uma deformidade social que
precisava ser combatida. Para grande parte da vizinhança, um
desrespeito que atrapalhava o comércio, enfeava endereços e assombrava a
paz. Na ponta da discórdia, uma médica estrangeira, loura, de olhos
azuis e coração enorme: Irene Adams, holandesa, imunologista,
voluntária, decidida a impedir o avanço das contaminações pelo vírus da
Aids entre os meninos de rua. Na casa de apoio, atraída pelo pão e
pelo cobertor para os tempos de fome e frio, a meninada acabava
recebendo também o carinho da doutora, de plantão, disposta a ensinar o
amanhã. Em 2012, passados mais de 20 anos, a clínica Ação
Multiprofissional com Meninos em Risco (Ammor) já acolheu 2.509
menores, dos quais 28 soropositivos. Juntos, duas gerações somam os
“filhos” de Irene, viúva, mãe e avó, que, longe da família – na Europa e
nos Estados Unidos –, vive de lançar luz ao futuro de quem não conhece
esperança.
Doutora Irene Adams, de 72 anos e sotaque carregado, fala da afilhada Marlene, de 40, com a satisfação de quem acompanha a realização dos filhos: “Ela esteve comigo em 1989, quando nos conhecemos. Hoje, ela tem marido, filhos e acabou de ser avó. Até hoje vem fazer ‘check-up’ comigo”. Diz-se feliz pela amizade fortalecida com a menina saudável e crescida, retirada das ruas. Sorriso aberto, o semblante é de quem aprendeu a sorrir com a alegria do outro. No apartamento modesto, bem próximo à tumultuada Avenida Cristiano Machado, pilhas de papéis sobre mesas e bancadas da sala. “Não repare, sou uma workaholic”, faz menção à condição permanente de pouco sono e muito trabalho.
Elegante, de roupa social econômica – calça, camisa e paletó –, tem nos pés tênis surrado. Especialista em imunologia, com passagem por diversos países, não é de falar de si. Com relógio de plástico no pulso, mostra-se simples, atenta apenas ao necessário para levar adiante uma vida missionária. “Não gasto com relógio caro e não tenho nenhum tipo de joia. O pouco me basta. Sou uma pessoa frugal”, considera-se. O carinho pelo Brasil aumentou na década de 1970, em viagem com o marido, funcionário de multinacional, para o Rio de Janeiro. Na década seguinte, no surgimento da Aids, já era médica em Belo Horizonte. Tinha interesse intelectual pela doença e amor arrebatador pelas crianças de rua, segundo ela, “alvo pontecial para a proliferação do vírus”.
“Como médica, trabalhando há tempos com doenças autoimunes, veio a Aids, uma doença relativamente nova. Eu conseguia lidar bem com pacientes com câncer nessa situação potencialmente fatal, mas, com a Aids, descobri que era diferente”, conta, que também é oncologista. Irene revela que foi tocada pelo preconceito e por toda a culpa que chegava junto do vírus HIV. Para a doutora, a pessoa com Aids precisava de muito mais que um médico. Emocionada, faz voltar os ponteiros da própria história: “Fui uma criança muito doente. Lembro-me aos 4 anos quando entrava num consultório, sofrendo, e vinha a pessoa de branco… só a presença dela já me tranquilizava. Foi quando, pequena, decidi ser médica e ajudar os outros”.
O início
Para a doutora, a Aids trouxe a necessidade de um novo profissional da saúde, bom ouvinte, atento às particularidades vindas no rastro do novo mal, que dava o que falar em todo o mundo. Em 30 de abril de 1987, durante comemoração do Dia da Rainha, feriado importante na Holanda, Irene conheceu um casal de voluntários que estava no Brasil trabalhando com menores de rua. Da conversa sobre Aids e crianças abandonadas, a pergunta: “O que aconteceria se uma criança de rua fosse contaminada?”. Foi o suficiente para que a holandesa abraçasse a causa e decidisse fincar raízes na capital mineira.
No início, entre os principais aliados, a Arquidiocese de Belo Horizonte por meio da Pastoral do Menor, e o colega imunologista da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Dirceu Bartolomeu Greco. “Foi quando conseguimos verba para um projeto de prevenção entre os meninos de rua. Nessa época, a pastoral ganhou espaço no porão da Igreja Nossa Senhora da Conceição e os meninos compareciam por causa da casa de apoio”, diz. Das descobertas na nova missão, Irene destaca “a pessoa dentro da pessoa”. A médica missionária considera que mais que ajudar, é preciso acreditar nos desfavorecidos. “É preciso entender que dentro de um menor infrator tem uma pessoa que precisa de ajuda”, diz.
“Ele não quer muito. Quer ser tratado como pessoa. Muitos garotos voltavam com frequência para o ‘check-up’ para o contato com a clínica, apenas para que pudessem ser olhados sem medo. Para se sentirem respeitados. Pense bem: já não têm família e ainda vivem sob o olhar do medo e da discriminação. Que futuro poderiam ter? Não é um trabalho de atendimento médico apenas. É ação. É resgate”, explica. “A Aids era de menos. A doença, em média, depois da contaminação, leva 10 anos para os primeiros sintomas. A maioria das crianças de rua não tinha essa perspectiva de vida. Imagine: todo mundo dizendo ‘você não presta’, ‘você é criminoso’. O menino passa a acreditar nisso, porque tem baixa autoestima”, ressalta.
Irene conta que hoje 90% das crianças acolhidas pela Ammor vieram de abrigos. Felicidade e orgulho se confundem no azul iluminado dos olhos. Para a doutora, impossível não ficar feliz com o resultado da força-tarefa pela proteção dos pequenos carentes. “Hoje temos o Estatuto da Criança e do Adolescente e o Conselho Tutelar, que movimentam toda uma rede de proteção ao menor. Tenho muito orgulho de morar em Belo Horizonte, de ser cidadã honorária da cidade. Sinto-me parte dessa rede. Seria impossível realizar sozinho algo dessa natureza”, considera. No entanto, para a missionária, os avanços ainda estão longe de eliminar os problemas.
“A grande maioria dos menores vem de famílias esfaceladas. Estão nos abrigos porque as famílias continuam desestruturadas, porque não há referências de uma vida diferente. Porque falta amor, respeito. Temos uma equipe que vai aos abrigos e trabalham dinâmicas com educadores e educandos do lugar. Uma pergunta muito importante na qual eles aprendem a pensar é ‘quem sou eu?’. É preciso que eles se reconheçam e ganhem confiança, acreditem num novo caminho”, sugere. Irene diz que a certeza de que seu trabalho está na direção correta vem do retorno de seus afilhados. “Muitos meninos que passaram pela clínica, voltam. Não para pedir dinheiro, mas em busca de um olhar de carinho.”
Família
Os filhos de sangue estão longe. Um nos EUA, onde atua como representante comercial. A outra, engenheira, faz carreira na Bélgica. Não são eles ou os netos a maior preocupação da doutora. São os filhos “adotados”, invisíveis, os que tiram seu sono. Entre 1992 e 1996, a imunologista trouxe recursos de organizações holandesas para as crianças de Belo Horizonte. “O apoio foi interrompido porque eles disseram que o Brasil é um país rico, que aqui o problema é a distribuição de renda”, conta. Irene Adams critica a falta de tradição do brasileiro em ser voluntário. Lamenta a falta do hábito de doações regulares aos projetos sociais que ajudam a combater as diferenças.
“Na Holanda, nos Eua, isso é muito diferente. Meu sonho é de uma nova consciência que dê sustentabilidade aos trabalhos sociais. Lutar pela cidadania dos outros é ganhar a minha cidadania. Aqui, eu não tenho direito ao voto, mas vocês precisam votar muito certo. Por vocês e por mim”, provoca. Solitária, imersa em mundaréu de compromissos, lazer só tarde da noite, com os filmes Amor impossível, de Lasse Hallström, e Para Roma, com amor, de Woody Allen, anotados na agenda. Para encerrar a conversa, o desejo de quem aprendeu amar as crianças de Belo Horizonte, de graça: “Já comprei meu abrigo no Cemitério do Bonfim. Quero ser enterrada na cidade onde aprendi a viver”, sorri.
SAIBA MAIS: PROJETO AMMOR
O foco do projeto está no desenvolvimento humano de excluídos. As pessoas são motivadas a procurar atendimento médico pela informação e prevenção. Com isso, o paciente tem a autoestima resgatada, a cidadania e a convivência com a família. Em 2006, com o fechamento da Clínica Nossa Senhora da Conceição (CNSC) –projeto da Arquidiocese de Belo Horizonte que acolhia pacientes com câncer terminal e portadores do vírus HIV – serviços sociais importantes ficaram sem teto. A imunologista Irene Adams resolveu integrá-los à Clínica Ammor. Assim, o projeto integra ações como o Comvidha, de assessoria jurídica; o Papel e Cia, de capacitação por meio de oficinas de artes; a Academia de Ginástica Movimento Saúde, a Cooperativa Grupo Solidário, além do atendimento às crianças e adolescentes em risco social. Informações: (31) 3444-3877 e 9503-8277.
Doutora Irene Adams, de 72 anos e sotaque carregado, fala da afilhada Marlene, de 40, com a satisfação de quem acompanha a realização dos filhos: “Ela esteve comigo em 1989, quando nos conhecemos. Hoje, ela tem marido, filhos e acabou de ser avó. Até hoje vem fazer ‘check-up’ comigo”. Diz-se feliz pela amizade fortalecida com a menina saudável e crescida, retirada das ruas. Sorriso aberto, o semblante é de quem aprendeu a sorrir com a alegria do outro. No apartamento modesto, bem próximo à tumultuada Avenida Cristiano Machado, pilhas de papéis sobre mesas e bancadas da sala. “Não repare, sou uma workaholic”, faz menção à condição permanente de pouco sono e muito trabalho.
Elegante, de roupa social econômica – calça, camisa e paletó –, tem nos pés tênis surrado. Especialista em imunologia, com passagem por diversos países, não é de falar de si. Com relógio de plástico no pulso, mostra-se simples, atenta apenas ao necessário para levar adiante uma vida missionária. “Não gasto com relógio caro e não tenho nenhum tipo de joia. O pouco me basta. Sou uma pessoa frugal”, considera-se. O carinho pelo Brasil aumentou na década de 1970, em viagem com o marido, funcionário de multinacional, para o Rio de Janeiro. Na década seguinte, no surgimento da Aids, já era médica em Belo Horizonte. Tinha interesse intelectual pela doença e amor arrebatador pelas crianças de rua, segundo ela, “alvo pontecial para a proliferação do vírus”.
“Como médica, trabalhando há tempos com doenças autoimunes, veio a Aids, uma doença relativamente nova. Eu conseguia lidar bem com pacientes com câncer nessa situação potencialmente fatal, mas, com a Aids, descobri que era diferente”, conta, que também é oncologista. Irene revela que foi tocada pelo preconceito e por toda a culpa que chegava junto do vírus HIV. Para a doutora, a pessoa com Aids precisava de muito mais que um médico. Emocionada, faz voltar os ponteiros da própria história: “Fui uma criança muito doente. Lembro-me aos 4 anos quando entrava num consultório, sofrendo, e vinha a pessoa de branco… só a presença dela já me tranquilizava. Foi quando, pequena, decidi ser médica e ajudar os outros”.
O início
Para a doutora, a Aids trouxe a necessidade de um novo profissional da saúde, bom ouvinte, atento às particularidades vindas no rastro do novo mal, que dava o que falar em todo o mundo. Em 30 de abril de 1987, durante comemoração do Dia da Rainha, feriado importante na Holanda, Irene conheceu um casal de voluntários que estava no Brasil trabalhando com menores de rua. Da conversa sobre Aids e crianças abandonadas, a pergunta: “O que aconteceria se uma criança de rua fosse contaminada?”. Foi o suficiente para que a holandesa abraçasse a causa e decidisse fincar raízes na capital mineira.
No início, entre os principais aliados, a Arquidiocese de Belo Horizonte por meio da Pastoral do Menor, e o colega imunologista da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Dirceu Bartolomeu Greco. “Foi quando conseguimos verba para um projeto de prevenção entre os meninos de rua. Nessa época, a pastoral ganhou espaço no porão da Igreja Nossa Senhora da Conceição e os meninos compareciam por causa da casa de apoio”, diz. Das descobertas na nova missão, Irene destaca “a pessoa dentro da pessoa”. A médica missionária considera que mais que ajudar, é preciso acreditar nos desfavorecidos. “É preciso entender que dentro de um menor infrator tem uma pessoa que precisa de ajuda”, diz.
“Ele não quer muito. Quer ser tratado como pessoa. Muitos garotos voltavam com frequência para o ‘check-up’ para o contato com a clínica, apenas para que pudessem ser olhados sem medo. Para se sentirem respeitados. Pense bem: já não têm família e ainda vivem sob o olhar do medo e da discriminação. Que futuro poderiam ter? Não é um trabalho de atendimento médico apenas. É ação. É resgate”, explica. “A Aids era de menos. A doença, em média, depois da contaminação, leva 10 anos para os primeiros sintomas. A maioria das crianças de rua não tinha essa perspectiva de vida. Imagine: todo mundo dizendo ‘você não presta’, ‘você é criminoso’. O menino passa a acreditar nisso, porque tem baixa autoestima”, ressalta.
Irene conta que hoje 90% das crianças acolhidas pela Ammor vieram de abrigos. Felicidade e orgulho se confundem no azul iluminado dos olhos. Para a doutora, impossível não ficar feliz com o resultado da força-tarefa pela proteção dos pequenos carentes. “Hoje temos o Estatuto da Criança e do Adolescente e o Conselho Tutelar, que movimentam toda uma rede de proteção ao menor. Tenho muito orgulho de morar em Belo Horizonte, de ser cidadã honorária da cidade. Sinto-me parte dessa rede. Seria impossível realizar sozinho algo dessa natureza”, considera. No entanto, para a missionária, os avanços ainda estão longe de eliminar os problemas.
“A grande maioria dos menores vem de famílias esfaceladas. Estão nos abrigos porque as famílias continuam desestruturadas, porque não há referências de uma vida diferente. Porque falta amor, respeito. Temos uma equipe que vai aos abrigos e trabalham dinâmicas com educadores e educandos do lugar. Uma pergunta muito importante na qual eles aprendem a pensar é ‘quem sou eu?’. É preciso que eles se reconheçam e ganhem confiança, acreditem num novo caminho”, sugere. Irene diz que a certeza de que seu trabalho está na direção correta vem do retorno de seus afilhados. “Muitos meninos que passaram pela clínica, voltam. Não para pedir dinheiro, mas em busca de um olhar de carinho.”
Família
Os filhos de sangue estão longe. Um nos EUA, onde atua como representante comercial. A outra, engenheira, faz carreira na Bélgica. Não são eles ou os netos a maior preocupação da doutora. São os filhos “adotados”, invisíveis, os que tiram seu sono. Entre 1992 e 1996, a imunologista trouxe recursos de organizações holandesas para as crianças de Belo Horizonte. “O apoio foi interrompido porque eles disseram que o Brasil é um país rico, que aqui o problema é a distribuição de renda”, conta. Irene Adams critica a falta de tradição do brasileiro em ser voluntário. Lamenta a falta do hábito de doações regulares aos projetos sociais que ajudam a combater as diferenças.
“Na Holanda, nos Eua, isso é muito diferente. Meu sonho é de uma nova consciência que dê sustentabilidade aos trabalhos sociais. Lutar pela cidadania dos outros é ganhar a minha cidadania. Aqui, eu não tenho direito ao voto, mas vocês precisam votar muito certo. Por vocês e por mim”, provoca. Solitária, imersa em mundaréu de compromissos, lazer só tarde da noite, com os filmes Amor impossível, de Lasse Hallström, e Para Roma, com amor, de Woody Allen, anotados na agenda. Para encerrar a conversa, o desejo de quem aprendeu amar as crianças de Belo Horizonte, de graça: “Já comprei meu abrigo no Cemitério do Bonfim. Quero ser enterrada na cidade onde aprendi a viver”, sorri.
SAIBA MAIS: PROJETO AMMOR
O foco do projeto está no desenvolvimento humano de excluídos. As pessoas são motivadas a procurar atendimento médico pela informação e prevenção. Com isso, o paciente tem a autoestima resgatada, a cidadania e a convivência com a família. Em 2006, com o fechamento da Clínica Nossa Senhora da Conceição (CNSC) –projeto da Arquidiocese de Belo Horizonte que acolhia pacientes com câncer terminal e portadores do vírus HIV – serviços sociais importantes ficaram sem teto. A imunologista Irene Adams resolveu integrá-los à Clínica Ammor. Assim, o projeto integra ações como o Comvidha, de assessoria jurídica; o Papel e Cia, de capacitação por meio de oficinas de artes; a Academia de Ginástica Movimento Saúde, a Cooperativa Grupo Solidário, além do atendimento às crianças e adolescentes em risco social. Informações: (31) 3444-3877 e 9503-8277.
quarta-feira, 4 de julho de 2012
terça-feira, 3 de julho de 2012
Entre o Rio+20 e a Cúpula dos Povos
Caio Marçal*
Há alguns
clichês que cada vez mais encontram eco em mundos diferentes e em conflito.
Palavras como "sustentabilidade", “diálogo” "conservação
ambiental" e "direitos coletivos aos recursos naturais" foram
muito ouvidos na Cúpula dos Povos e no Rio+20 tanto por mim e por meus irmãos
das Igrejas Ecocidadãs (coletivo do qual a Rede FALE faz parte). Temáticas tão
próximas, mas com um vasto abismo que separava os dois espaços. Soava-nos
estranho ouvir tais termos sem sentir o desconforto de que havia algo dissonante
no Rio de Janeiro. Colocados em cantos extremos da cidade,
Marcos
Custódio, ambientalista cristão, em uma de nossas reuniões de avaliação,
afirmou que “existe um abismo entre a
Cúpula do Povos e Rio+20 (oficial). Existe a sociedade de um lado – e do outro
o governo e a economia. Tem pouca gente
disposta a fazer ponte. É muito frustrante. É duro quando você ouve que um
lugar representa 'X' e o outro 'Y". Morgana Boostel, Secretária Executiva
da Rede FALE, arremata: "Os
"Diálogos" acontecem depois que o espaço de negociação já foi
fechado. Ocorre em um espaço ocioso entre a negociação e o início da
conferência oficial Rio+20. Eu acho que
não houve um espaço "bilateral" de diálogo". Embora credenciados
para “participar” do Rio+20, nosso poder de interferência no documento final (extremamente
desanimador), foi nulo, já que fomos transformados em meros expectadores de um
pacto de conteúdo inócuo.
Minha suspeita
é que os que têm poder de decisão nas questões ambientais estão convencidos que
não precisam fazer pontes que produzam mudanças de rumo ante a devastação da
vida. A pergunta que não podemos fugir é de que lado os seguidores de Cristo
estão. Não podemos entrar de modo inocente neste jogo e não perceber quais os
interesses dos poderosos e das grandes corporações em relação as questões
ambientais. A Igreja, em meio a essa turbulência deve cumprir um duplo
papel: Ser ponte para restaurar o
diálogo(arrependimento), mas também profético (denúncia).
Infelizmente
tivemos uma presença ainda incipiente dos cristãos tanto na Cúpula dos Povos e
no Rio+20. Poderia até dizer que as religiões de menor expressão que os
evangélicos tem um interesse e envolvimento muito maior. O fato de existir um
movimento de Igrejas Ecocidadãs já demonstra que há certo contrassenso, pois
toda igreja deveria ser tanto preocupada com a cidadania quanto com o meio
ambiente. Se há um movimento de “Igrejas Ecocidadãs”, é porque existe descaso
por parte daqueles que deveriam ser os maiores interessados. Temos um desafio de ordem teológico, pastoral
e profético para os próximos anos e precisamos envolver nossa comunidade local
de fé para cumprir a totalidade da missão de redimir toda Criação, pois ela
“espera ardentemente a manifestação dos filhos de Deus” (Romanos 8:19).
Apesar disso,
podemos celebrar a participação do coletivo das Igrejas Ecocidadãs, pois
construiu links interessantes e canais de interação através das atividades
propostas pelas organizações parceiras na Cúpula dos Povos. Vale registrar que
tivemos a oportunidade de entregar cartões da Campanha “Fale em favor de um
Mundo Justo e Sustentável” diretamente para Gilberto Carvalho, atual
ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República do Brasil.
Embora um tanto
perplexos com o tamanho dos desafios e que saibamos que talvez não vejamos
fruto de nossos anseios satisfeitos nos próximos anos, saímos felizes porque
sabemos que com nosso suor e lágrimas as sementes do Reino de Deus um dia
brotarão no chão desse mundo, que
trará vida plena e abundância.
*Sec. De Mobilização da Rede FALE - LEVANTE A SUA VOZ CONTRA A INJUSTIÇA
www.fale.org.br
tel: (031) 93086548
www.fale.org.br
tel: (031) 93086548
segunda-feira, 2 de julho de 2012
Amar o pecador, mas odiar o pecado
Eduardo Ribeiro Mundim
Esta
é uma frase frequentemente usada quando se está discutindo algum
assunto de natureza moral. Ela parece estar de acordo com as
Escrituras; parece se ajustar perfeitamente aos desejos de Deus para
seus filhos; parece ser a correta recomendação para a correta
atitude frente às questões morais.
Eu
não concordo!
Esta
afirmativa é uma farsa, um arranjado piedoso de palavras com
intenção assassina.
Concordo
que estou usando termos pesados e confesso que o faço impulsionado
pela emoção de já ter sido vitimado por ela. Sim, já me disseram
que me amavam, mas odiavam o pecado que, supostamente, eu defendia.
Mas
esta é uma história já velha...não sei se perdoei seus
atores...tão pouco não estou bem certo de que eles se arrependeram
e se desculparam.
Minha
intenção com este preâmbulo é sublinhar as consequências
emocionais de sua natureza oculta pelo seu aspecto piedoso.
A
piedade supostamente reside no amor distribuído a todos,
independente de quem são. Deus ama a todos, indistintamente, e na
sua presença não há um justo sequer. Logo, amar o pecador nada
mais é que repetir a ação divina. Ação esta, o amor, que O
define, segundo o apóstolo João: “Deus é amor” (I Jo 4.16).
Por amor, Ele cria o mundo, cria seres racionais à Sua imagem e
semelhança, torna-se homem e vive como tal, compartilhando as mais
ordinárias experiências do cotidiano, como sujar os pés de terra e
ter a fome saciada e escolhendo suportar as mais extraordinárias
experiências, como a traição, a tortura, a injustiça e a morte.
E
Sua Palavra não nega o mandamento. Desde o princípio é amar: a
Ele, Criador, em primeiro, e ao próximo, em segundo. Proponho que
seja entendido que Sua prioridade não se deva ao fato de que Seus
mandamentos definem o que é amar, mas que somente nos é possível
tal atitude por sermos alvos dela a partir dEle: “Nós amamos
porque Ele nos amou primeiro” (I Jo 4.19). O
Seu amor é o molde, a forma, o modelo, a receita do que é amar. E,
em última instância, mais do que “amar ao próximo com a si
mesmo” (Mc 12.33) é “devemos dar nossa vida por nossos irmãos”
(I Jo 3.16).
Amar
é ter afeição, querer bem, ter ternura e devoção; apreciar
muito, gostar, preferir. Não há desagregação, destruição,
violência. Combina perfeitamente com os frutos do Espírito:
“alegria, paz, paciência, amabilidade, bondade, fidelidade,
mansidão, domínio próprio”. Na verdade, é o primeiro fruto,
“agapê”, amor sacrificial. E como Paulo apóstolo instruiu, o
maior dentre os três maiores dons: fé, esperança e amor (I Co
13.13).
Odiar
é ter aversão, horror, inimizade, repulsa, desgosto. É desejar
estar separado, é ser hostil. Não há intenção de agregar, de
somar, de atrair. Contendas, ciúmes, iras, facções, dissensões,
invejas são suas companheiras, e são chamadas pelo mesmo apóstolo
de frutos da carne – incompatíveis com a herança do Reino de
Cristo e de Deus (Gl 5.19-21).
Aos
que erguem o título acima com orgulho, pergunto: onde está o
mandamento para odiar, seja o que for?
A
bandeira de “odiar o pecado” é ilegítima.
Ilegítima
porque não há mandamento para que tomemos tal atitude.
Bastarda
porque “pecado” não é um ser, é um ato. Como tal, não tem
existência própria, mas é uma atitude. Portanto, “pecado” não
existe sem “pecador”. Amar um é, em termos humanos, em certa
medida, amar o outro; odiar um, odiar o outro.
Enquanto
seres humanos é possível a proeza de detestar o ato cometido por
alguém que se ama?
Acredito
que sim. Se o amor preceder o ódio; se o amor definir a relação
entre as pessoas, e não o ódio; se amamos apesar da atitude que
repulsa. Mas não podemos começar odiando o pecado, porque será o
ódio que dará o tom. E o que deu o tom inicial da criação de Deus
foi amor, integração, doação, compartilhar.
É
verdade que Paulo explicitamente ordena que odiemos o que é mal, e
que nos apeguemos ao que é bom (Rm 12.9). Mandamento perigoso, que
nos remete ao fio da navalha, pois odiar é próprio de nossa
natureza pervertida e caída, e apegar ao bem é atitude que,
frequentemente, demanda esforço. Mas se entendermos odiar como
“cultivar o sentimento de repulsa por aquilo que é mal e que brota
primeiro em mim, antes de brotar no meu próximo”, todo o perigo se
vai.
Se
eu odiasse o pecado que primeiramente habita em mim, e me amasse
apesar dele, talvez então eu pudesse primeiramente amar o meu
próximo e odiar o seu pecado, que encontro primeiro em mim.
Pois
nas Escrituras pecado é pecado, não há escala de maior ou menor.
Todos ofendem à santidade divina. E é uma impossibilidade bíblica
o ser humano isento de pecado. Portanto, se meu próximo é imoral,
talvez eu seja mentiroso; se ele é mentiroso, talvez eu seja
fofoqueiro; se ele é fofoqueiro, talvez eu não ame...
“Odiar
o pecado” não deve ser nossa preocupação, mas amar o pecador,
pois o estaremos amando como amamos a nós mesmos, e, se buscarmos do
fundo do coração, como Ele ama. Não há necessidade de ódio, pois
amor e ódio são, neste caso, como luz e trevas: um não está onde
está o outro.
“Odiar”
é chamar o caminho largo e fácil; “amar” é andar pelo caminho
estreito, aquele que poucos escolhem trilhar.
Por último, devo confessar: quando odiei o pecado, odiei também o pecador; quando me vi pecador, aspirei a santidade, minha e do meu próximo.
Por último, devo confessar: quando odiei o pecado, odiei também o pecador; quando me vi pecador, aspirei a santidade, minha e do meu próximo.
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