Eduardo Ribeiro Mundim
A Ultimato decidiu publicar, na seção das cartas, no primeiro número
de 2012, o comentário que fiz daquela escrita pelo irmão Luciano,
originalmente postado no sítio da revista e no CrerPensar.
Acrescentou suas próprias considerações, úteis ao debate. A
decisão de registrar na versão impressa o postado na virtual
mostra, mais uma vez, a postura de coragem da equipe editorial. Mais
fácil teria sido deixar passar e não colocar "mais lenha na
fogueira". As ponderações que fez contribuem e convidam ao
aprofundamento da reflexão.
É
verdade que Jesus chama ao arrependimento e à mudança de vida; é
verdade que Ele chama por demonstrações objetivas deste
arrependimento e estabelece critérios claros do que seja a novidade
de vida que espera daqueles que O confessam Senhor e Salvador.
É
verdade que pela Sua morte e ressurreição o pecado não mais dita o
destino do Seu povo. É verdade que nesta vida continuaremos a pecar
e a confessar - se dissermos não estarmos sujeitos a isto,
"fazemo-Lo mentiroso e o Seu amor não permanece em nós".
É
certo que os Seus discípulos devem buscar conscientemente a Sua
semelhança, o que é chamado por alguns de santificação. Buscá-la
com afinco. Não é prudente contar este processo como possível de
ser alcançado nesta vida com plenitude, pelo exposto anteriormente.
Segundo
Paulo aqueles que cometem adultério,
prostituição, impureza, lascívia, idolatria, feitiçaria,
inimizades, porfias, emulações, iras, pelejas, dissensões,
heresias, invejas, homicídios, bebedices e glutonarias não herdarão
o Reino de Deus (habitualmente interpretado como "não serão
salvos"). A coerência pede que o apóstolo seja entendido
dizendo que estão fora do Reino aqueles que recusam a alternativa de
abandonarem um caminho de rebelião aberta contra Deus Pai,
manifestada pelas atitudes permanentes, talvez definidoras do caráter
da pessoas, exemplificadas de; forma não exaustiva por essa lista.
Ela é encerrada pela expressão "e coisas semelhantes a estas".
Glutonarias
é, no grego, kômoi. Este termo aparece apenas 3 vezes no Novo
Testamento(1) e não é estudado em obras de referência(2). Também
é traduzido por “orgias”. Segundo o Houaiss, orgia era uma
festividade em honra ao deus Baco, e passou a ter o significado de
festa caracterizada pela ausência de limites, pelo excesso, seja no
beber, no comer ou na atividade sexual. Glutonaria é o ato de comer
em excesso. A qual dos dois significados o apóstolo se referia?
Potencialmente
ambos estariam no contexto. Orgia abrangeria pelo menos os 5
primeiros frutos da carne citados e o último; glutonaria seria o
termo esperado após bebedices, e estaria também incluído em orgia.
O comentário de Calvino parece favorecer glutonaria(3).
Todos
os excessos resumidos em orgia são cometidos na esfera privada e, na
dependência da circunspecção dos envolvidos, permanecem ocultos –
à exceção provável de bebedices (se pensarmos no comportamento do
alcoolista como exemplo) e da glutonaria, evidenciado pelo excesso de
peso, caso seja um comportamento diário.
Não
é possível a obesidade na ausência do consumo excessivo de
nutrientes.
Estariam
os obesos incluídos na relação dos frutos da carne? Se a obesidade
somente pode ser consequente ao excesso de nutrientes, por que
herdariam eles o Reino de Deus?
Enquanto
escrevo, não consigo evitar a sensação de estar sendo ridículo.
Contudo, racionalmente falando, a questão permanece, seja risível
ou não: diversos comportamentos são evidências de um ser não
transformado pela graça divina, em um espectro que vai da condenação
social unânime (homicídios) ao risível (obesidade), passando pelo
socialmente tolerável dentro de limites elásticos (inveja e
inimizades).
É
premissa cristã, e fortemente evangélica, a inexistência de pecado
que não separe o ser humano de Deus – todo e qualquer pecado,
tenha o impacto social ou particular que for, faz separação
intransponível entre ambos. A única possibilidade de ponte é a
cruz de Cristo.
Homossexualidade
e obesidade parecem, portanto, estarem no mesmo barco: não entrarão
no Reino de Deus.
É
isto mesmo?
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(1)
Concordância Fiel do Novo Testamento, vol I, pag 2968, 1a
ed
(2)
O Novo Dicionário da Bíblia 3a ed, Enciclopédia
Histórico-Teológica da Igreja Cristã 1a ed, Dicionário
Internacional de Teologia do Novo Testamento 1a ed
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