segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Fé, Ciência e Bioética VII

CIÊNCIA, FÉ E BIOÉTICA

 

Ética é a disciplina filosófica que valoriza, que hierarquiza valores. Bioética tem várias definições. Uma delas, onde faço pequena modificação, a define como "a ciência do comportamento moral dos seres humanos diante de toda a intervenção da biotecnociência e das ciências da saúde sobre a vida [e o meio ambiente], em toda a sua complexidade".

 

Bioética utiliza todo o conhecimento humano acumulado, seja técnico-matemático, seja biológico-filosófico. É multidisciplinar. Nenhum subconhecimento a contém; ela perpassa por todos na sua transdiciplinaridade. Chama ao diálogo, mediado pela razão, todos os interessados em suas questões, reunindo todos os preconceitos, desmascarando-os e, frequentemente, reforçando-os.

 

Hoje faz parte do cardápio de temas no almoço e encontros sociais, das matérias escolares em todos os níveis, da imprensa. E todos que desejam, palpitam.

 

Provavelmente na cultura ocidental a maior parte dos crentes (lembrando que o termo aqui define aquele que livremente abraça uma fé) não distoa da média em um bom número de tópicos bioéticos. Os critérios da ética principialista (autonomia, beneficiência, não-maleficiência e justiça) dificilmente seriam questionados. O uso indiscriminado  de placebo contra drogas em avaliação envolvendo populações doentes (como a investigação de medicamentos para AIDS em populações africanas) deve ser consensualmente (o que não quer dizer unanimemente) condenado, baseado no princípio de que a vida humana tem mais valor que a economia da indústria farmacêutica. Pontos semelhantes a esses dificilmente despertam o antagonismo fé-ciência.

 

É correto o uso de células-tronco? engravidar para que o segundo filho forneça células e tecidos (sem maiores danos para ele) para o irmão? fazer exames genéticos que podem predizer as chances de sofrer alguma doença grave?

 

Tendo em mente toda a discussão anterior, podemos estabelecer as seguintes linhas gerais:

1.      o crente, ao analisar uma questão bioética, o fará através de uma ética principialista própria da sua confissão de fé, com a qual, a princípio, firmou sua lealdade

2.      o não-crente, mas religioso, o fará levando em conta suas preferências filosóficas

3.      toda questão bioética é, por definição, filosófica, portanto, inabordável empiricamente

4.      o objetivo primário da ciência, a sobrevivência e conforto humanos,  propõe "a capacidade de fazer"

5.      a fé não questiona a capacidade, mas a utilidade comunitária, a igualdade de acesso, os custos em termos de valor, as repercussões sobre a moral vigente (sejam questionamentos ou novos desdobramentos)

a ciência somente colabora fornecendo modelos explicativos de algum aspecto pontual da realidade, jamais sendo a juíza final

Nenhum comentário:

Postar um comentário