segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Considerações críticas acerca do infanticídio indígena no marco dos direitos humanos

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ISSN 1983-4640 • Segunda-feira, 31 de agosto de 2009

por Gerôncio Ferreira Macedo Júnior

Title: Critical considerations about the infanticide native in the frame of the human rights

Abstract: The present article prevails by the analysis of the infanticide native in the juridical order brazilian with the objective of demystify of subject, highlighting, besides, the paradigm that establish, in Brazil, with the conquest of a conception multicultural of the human rights.

Keywords: Infanticide native; Collision of fundamental rights; Human dignity; Habits; Constitucional interpretation.

Resumo: O presente artigo prima pela análise do infanticídio indígena na ordem jurídica brasileira com o escopo de desmistificar o tema, salientando, ademais, o paradigma que se instaura, no Brasil, com o advento de uma concepção multicultural dos direitos humanos.

Palavras chave: Infanticídio indígena; colisão de direitos fundamentais; dignidade humana; costumes; hermenêutica constitucional.

Sumário: 1 introdução – 2 tensões entre o universalismo e relativismo cultural – 3 diálogo intercultural – a possibilidade de uma ética global –hermenêutica constitucional – à guisa de conclusão – referências

1.0 - Introdução

Tema que emana dificuldades na realidade hodierna é a concernente à manifestação de práticas infanticidas no seio de tribos indígenas, afigurando-se empreitada complexa enveredar por tais caminhos, vez que denota a tentativa de "desprezar", daquele que estuda o problema, os próprios juízos de valor, intrínsecos da atividade cognoscitiva, pois, os costumes, a religião e os valores, mostram-se barreiras, muitas vezes incólumes, de difícil acesso à exegese que se apresenta destinada a compreender as circunstâncias fáticas.

O infanticídio indígena por ser prática reiterada constitui-se em costume de povos nativos, alçados na Constituição, tutelados em seu art. 231, consoante o qual "são reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições(...)". Como consectário lógico do dispositivo – fruto da tendência mundial de proteção aos direitos dos povos – surge a idéia de direitos a alteridade e diversidade que, em passos largos, caminha para uma concepção realista da pluralidade de culturas que se desenvolvem no seio das nações.

Assentados estes ditames, sob os auspícios de uma nova hermenêutica constitucional, aberta e flexível, buscaremos analisar o reconhecimento e os óbices, por parte do Estado brasileiro, que persistem para a efetividade dos direitos dos povos, sobretudo, a colisão entre direitos fundamentais, a qual, pretende-se analisar neste artigo, dando ênfase ao conflito existente entre a dignidade da vida e os costumes indígenas que legitimam o infanticídio.

2.0 – As tensões entre o universalismo e o relativismo cultural

A visão contemporânea dos direitos inseridos na CF/88 por influência da declaração de 19481 e de inúmeros organismos internacionais de tutela, estabeleceram o paradigma universalista dos direitos que se afigura como obstáculo para a efetividade dos direitos fundamentais ao colidir com a concepção relativista cultural presente nas Cartas anteriores e que ainda impregna a Constituição de 1988. Explica-se.

Desde o período pré-constituição de 1988, fixo e inerte, é possível constatar a vigência do relativismo cultural, especialmente, em decorrência da ultrapassada visão integracionista que engloba o Estatuto do Índio. Esta teoria parte do pressuposto que em decorrência da existência de uma "pluralidade de culturas no mundo, estas culturas produzem seus próprios valores"2, tornando nulo, portanto, a legitimação do universalismo. Vale dizer, enquanto a concepção universalista aduz um valor inerente a todo ser humano, o relativismo nega-o, ao asseverar que os valores são relativizados a partir da análise de cada cultura, firmando, assim, que os direitos seriam relativos e não universais.

Exemplo atual é a questão referente ao infanticídio indígena no alto do Xingu, onde tribos isoladas praticam há séculos tal costume que é defendido prontamente por antropólogos e sociólogos, além da FUNAI e FUNASA, órgãos legitimados pela Constituição à tutela dos direitos dos índios e seus costumes.

O enclave diz respeito a seguinte questão: é legitimado ao índio ceifar a vida de um indivíduo da sua tribo, quando a Constituição proclama como pilar axiológico a dignidade da vida humana e, ao mesmo tempo, a tutela dos costumes indígenas?

Segundo o professor Erwin Frank, "esse é o modo de vida deles e não cabe a nós julgá-los com base nos nossos valores. A diferença entre as culturas deve ser respeitada", defende o antropólogo.3

Ao revés, encontram-se O.N.G.'s em defesa dos direitos humanos que bradam por uma concepção universalista, pretendendo a interrupção dos casos de assassínios de crianças, imediatamente, por parte de ações do governo federal.4

É de notar as contradições naturais entre valores ocidentais e tribais no que tange ao sentido da vida. Todavia, como mediar tal conflito? Se a Constituição surge como um instrumento de transformação social, valendo-se de suas normas para colmatar os conflitos do ser, o que fazer ante a incompatibilização de dois preceitos máxime?

De certo que não concordamos com a simples ampliação do universalismo a um ponto extremo, vez que acarretaria a remodelação de costumes indígenas, que como se verifica, é uma lesão de fato a direitos dos povos, inadmissível no regime Democrático de Direito. Também não concordamos com a relativização extrema dos direitos, pois, ocasionaria a existência, no sistema constitucional, de um paradoxo ao sustentar a vida como valor máximo e, indiretamente, legitimar costumes indígenas na prática do infanticídio.

Desde logo, ademais, faz-se necessário recorrer a uma conciliação entre esses princípios, um cotejo entre teorias com vistas a uma aplicação concreta que não venha a excluir do ordenamento jurídico, por irremediável contradição, postulados basilares do Estado, muito menos, a descaracterização do modus vivendi das tribos indígenas.

3.0 – Diálogo intercultural

O diálogo intercultural foi cunhado por Boaventura de Souza Santos, que ao refletir acerca do atual paradigma da modernidade chegou à conclusão que as políticas de direitos humanos estavam fadadas ao fracasso em virtude da crise do Weltfare State.5

Com a perplexidade de como foram concebidos, os direitos são reconhecidos como universais, uma vez que se identificam com a política hegemônica e, portanto, acabam funcionando como mecanismo de "choque de civilizações" (Samuel Huntington, 1993). Neste contexto, o infanticídio indígena se enquadra por ser repudiado, já que, ao conflitar diretamente com valores ocidentais está atentando contra a ordem vigente onde se situam, atualmente, as políticas hegemônicas. Idêntico caso ocorre na África do sul, com seus conflitos entre grupos étnicos de dimensão internacional.

Assevera Boaventura que "contra o universalismo, há que se propor diálogos interculturais sobre preocupações isomórficas"6. Se os conflitos axiológicos existentes na concepção de dignidade humana são distintos, deve-se recorrer a um diálogo entre as culturas para que, se necessário for, modifique-se o núcleo de sentidos. Este processo de re-conceituação encontra guarida na "incompletude das culturas", isto é, cada cultura é imperfeita, pois, se não fosse, existiria apenas uma perfeita e acabada.7 Sendo necessário, assim, ampliar a consciência de "incompletude" para haver um diálogo intercultural que, finalmente, proponha a remodelação de direitos universais para multiculturais.8

Com efeito, o mecanismo que irá concretizar tal concepção de direitos é a hermenêutica diatópica, na qual, mediante o cotejo das diversas culturas em conflito, busca-se ampliar ao máximo a consciência de "incompletude" dos grupos, para que de fato se possa, através da troca de saberes, chegar o mais perto possível da weltanschauung.

Nesse sentido, a hermenêutica diatópica subtende a existência dos topoi que são "os lugares comuns retóricos mais abrangentes de determinada cultura" (Boaventura, 2003). São os locais onde se encontram os pilares irrefutáveis de cada cultura, sobre os quais hão de incidir todas as tentativas de diálogo intercultural. Exemplo disso é o topos do dharma na cultura hindu, o qual fundamenta a filosofia e crença oriental.

Nesse momento, todavia, afigura-se a problemática da teoria de Boaventura, quanto à utilização do topos no cotejo de culturas diferentes.

Sabemos que no Brasil não se pode falar em uma tribo, ou melhor, um mundo indígena, ao contrário, fala-se em mundos indígenas em decorrência da pluralidade de etnias que se desenrolam, por sua vez, em diversas tribos. Enquanto o dharma orienta a crença hindu, e o umma a cultura islâmica, nas tribos indígenas iremos encontrar as mais variadas concepções de existência ou vida, direito e moralidade.

Deste modo, a teoria de Boaventura para ser aceita na realidade brasileira com vistas a solver o problema posto, teria que desenvolver uma estrutura metodológica capaz de situar as diferentes acepções de dignidade existentes no seio de cada etnia, pois, recordando que o infanticídio não é verificável somente numa tribo, mas pelo contrário, tem sido registrada numa pluralidade de etnias, tais como: Uaiuai, Bororo, Mehinaco, Tapirapé, Ticuna, Amondaua, Uru-eu-uauuau, Suruwaha, Deni, Jarawara, Jaminawa, Waurá, Kuikuro, Kamayurá, Parintintin, Yanomami, Paracanã e Kajabi.9 Essa questão – de situar o topos de todas as etnias – nos leva a crer numa missão utópica, uma vez que a diversidade é tamanha que mal pode ser catalogada por antropólogos.

Teríamos, assim, que analisar e estudar os Yanomami, por exemplo, para posteriormente cotejá-la com o topoi dos direitos humanos, recordando sempre que dentro daquela encontraremos v.g. a tribo Sanumá, com uma concepção de dignidade de vida distinta de outras etnias.

Faz-se imprescindível, portanto, a observação e a análise de cada etnia em particular, sobretudo das concepções de direitos existentes no grupo a fim de localizar uma "ponte" entre as culturas. Não seguir essas observações é legitimar a segregação de raças como o fez a Constituição de 1969, autoritária e reducionista, pregando como desígnio a incorporação dos índios à comunhão nacional.

4.0 – A possibilidade de uma Ética global

De fato, que a renovação dos grupos étnicos em todo o mundo, na segunda metade do séc. XX, tem levantado inúmeras discussões, sejam políticas ou econômicas quanto ao remodelamento das sociedades contemporâneas. O trato com a questão étnica não pode mais ser posta de lado, pois "constitui um elemento inerente aos assuntos humanos e não desaparecerá se for ignorada" (Maybury-Lewis, 1993). Foi assim no México, que deu início a uma política de indigenismo na década de trinta, e amplificou-a, com a revisão de 1993, na qual proclamava-se uma sociedade multiétnica. Também na Malásia apelou-se para uma Constituição multiétnica, todavia, os atuais conflitos axiológicos inerentes ao convívio mútuo de grupos étnicos têm demonstrado falhas.

Esse novo paradigma foi denominado como "la era de la migración" porque quantidades ingentes de pessoas atravessaram as fronteiras, fomentando com que todos os países sejam mais ou menos poliétnicos.10 Descreveu-se, também, como a "era del nacionalismo" vez que é cada vez maior o número de grupos que se mobilizam e afirmam sua identidade.11 A Constituição do Brasil, nesse sentido, andou bem ao ampliar a esfera de tutela dos índios, com ressalvas, ademais, quanto à velha problemática da demarcação de suas terras.

A partir desse panorama, Roberto Cardoso de Oliveira munindo-se de uma releitura da ética discursiva de Habermas e da hermenêutica crítica de Karl-Otto Apel, além de sua experiência antropológica, propõe a aplicação de uma ética global ligada a tentativa de formular uma nova postura ética diante das crises entre valores no seio de comunidades distintas.

Em síntese, a pesquisa do antropólogo chega muito perto do diálogo intercultural tratado acima, no entanto a análise cingiu-se aos valores morais, daí a necessidade de distinguir moralidade de ética. A primeira "trata do que é igualmente bom para todos", enquanto a segunda engloba a necessidade de "auto-esclarecimento", ou de esclarecimento de quem somos e quem gostaríamos de ser (Habermas, 1993). Ilustra-nos bem o seguinte exemplo registrado por Charles Wagley, no qual foi identificado a prática de infanticídio entre os índios Tapirapés, cujo quarto filho era eliminado para manter o equilíbrio no ecossistema.12 O conflito identificado diz respeito à reação de um grupo de missionárias à prática infanticida, na qual depreende-se um choque entre valores.

Contrariamente ao que era de se esperar, pois a história mantém viva em seus registros os casos de imposição por parte de grupos externos, as missionárias, através de um diálogo pautado na ética, conseguiram convencer o grupo indígena a abdicar o infanticídio. Constatou-se nesse fato o que Cardoso chama de "comunidade de comunicação" entre dois grupos. Enquanto os índios davam mais valor a comunidade, as freiras intercederam pela vida, "o que não diminui o seu significado ético" (Cardoso, 2000).

Como se apreende, a proposta trazida acima prima pelo diálogo "argumentativo e democrático", onde o relacionamento interétnico é conduzido por linhas de "negociação" entre comunidades com crenças diferentes.

A problemática de sua teoria, no entanto, está na "fidúcia" depositada nos sujeitos externos, que nada mais são que os instrumentos para realizar essa ética, exemplo disso foi o colapso cultural causado pelos missionários da Missão Salesiana, ao impor os índios da etnia Bororo que abandonassem seu modus vivendi com alarde de cometerem o pecado do incesto.

5.0 – Hermenêutica constitucional

Decerto que o neoconstitucionalismo reclama que suas normas sejam seguidas para que a ordem não se transmute num caos. Nesse âmbito, a jurisdição constitucional é o mecanismo estabilizador do status quo e o elo para novos paradigmas. É na hermenêutica constitucional que se assenta a possibilidade de conduzir os conflitos para um total ou parcial desfecho.

Como é de praxe, os conflitos entre direitos fundamentais reconduzem-se, mormente, a um conflito de princípios.13 Sendo necessário, em todo caso, não olvidar das circunstâncias e buscar estabelecer qual princípio deve prevalecer, segundo um critério de justiça.14

A priori, o conflito tal como se ramifica, situa-se na "colisão de caráter negativo de um direito com o caráter positivo desse mesmo direito"15, em outros termos, o conflito entre a tutela constitucional da vida e a proteção dos costumes, no qual está compreendido o infanticídio. Assevera Canotilho que nesses casos impõem "a coordenação e combinação dos bens jurídicos em conflito de forma a evitar o sacrifício (total) de uns em relação aos outros".16 É o famoso princípio da concordância prática, pois a conseqüente colisão de valores plasmados na Constituição, favorece esse preceito na solução que não importe em exclusão de um ou outro, mas, ao revés, na sua conciliação.17

Nossa proposta, com fundamento no postulado da concordância prática e pautado nos fundamentos doutrinários aludidos acima, é que a solução do conflito deve ser norteada pela ponderação, seguido por circunstâncias que serão avaliadas em cada caso. Assim, se ficou constatado, nas pesquisas de Roberto Cardoso, que a "negociação ética" das missionárias foi capaz de neutralizar (ou pelo menos enfraquecer) o infanticídio na tribo, sem impor autoritariamente que cessasse o costume, insurge-se, assim, como instrumento para, se não alcançar, tentar enfraquecer esta prática, que, indubitavelmente, não atende as posições contemporâneas. Frise-se, desde já, que o direito dos povos deve ser resguardado a todo custo e não apregoamos a iniciativa despreparada de interceder com vistas autoritárias. A contrario sensu, clamamos pela criação de comissões especializadas em etnografia, compostas de antropólogos com notável conhecimento na área, para que criem "pontes" ou, no dizer de Boaventura, "diálogos interculturais" que definidos pela ética, alcancem soluções que se coadunem com o paradigma da Constituição e seus ditames.

Quanto à posição do Estado é verificável que o Congresso já se manifestou em audiência pública realizada em 2007, a requerimento do então deputado Henrique Afonso (PT/AC), na qual foram expostas opiniões divergentes acerca do caso em tela. O citado deputado é autor de projeto de lei, denominado Muwaji cujo escopo é combater praticas culturais "nocivas" ao país.

Saliente-se, todavia, que não concordamos com o conteúdo do projeto Muwaji18, pois consoante entendimento que perfilhamos, padece pela mácula da inconstitucionalidade material, quando dita pioneiramente, que os indivíduos que se omitirem de notificar a prática às autoridades – nada obstando, contudo, que não sejam indígenas –, recairão nas devidas sanções, de acordo com a lei penal vigente. De fato, que não podemos simplesmente no afã de resolver a questão impor aos índios que cumpram nossa legislação.

Ilustra-nos, no sentido da inconstitucionalidade, a interpretação do art. 6º, do citado projeto, segundo o qual:

    Constatada a disposição dos genitores ou do grupo em persistirem na prática tradicional nociva, é dever das autoridades judiciais competentes promover a retirada provisória da criança e/ou dos seus genitores do convívio do respectivo grupo e determinar a sua colocação em abrigos mantidos por entidades governamentais e não governamentais, devidamente registradas nos Conselhos Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente.

Como se vê, o projeto determina o exílio para o índio que não seguir a norma. Consideramos que essa possibilidade jamais deveria ser prescrita em lei, vez que não demonstra respeito às populações, que sequer têm noção e muito menos culpa da atividade que realizam.19

"Ninguém se escusa da lei" é preceito frio e decadente na doutrina, pois nem os doutos a conhecem integralmente. Agora, impor aos índios o conhecimento de nossa legislação é falácia, algo estarrecedor a se pensar. Nesse sentido estabelece o citado projeto que "é dever de todos que tenham conhecimento das situações de risco (...), notificar imediatamente as autoridades (...)".20 Sublinhe-se que de certa forma o índio está, também, dentro do alcance desse dispositivo.

Por conseguinte, consoante entendimento que a Constituição não legitima a cominação de sanções deste calibre a grupos étnicos, o citado projeto apresenta-se, pois, como uma violência que emerge para ferir de morte o princípio da proporcionalidade, limite para os excessos discricionários do poder público.

Observa-se, enfim, que a concepção universalista presente acima prescreve a submissão dos povos indígenas aos direitos reconhecidos ou hegemônicos, como a "arma do Ocidente contra o resto do mundo" (Samuel Huntington, 1993, pág, 25). Ato que não se harmoniza ao Estado Constitucional de Direito e atenta contra os povos.

6.0 – À guisa de conclusão

Os casos estudados demonstram que não é fácil diagnosticar a questão axiológica ocidental quando interligada com os conflitos étnicos. Sabe-se que a questão indígena sempre foi tida como uma problemática nas sociedades contemporâneas, aliás, em todo o mundo a questão étnica foi olvidada ou conduzida para "tentativas" de sublimações por parte dos governantes. O que fez Huntington denominar como uma "receita para o desastre" (is a recipe for disaster) a omissão do Estado nas questões étnicas.

O infanticídio indígena, nesse diapasão, está intimamente relacionado com tais questões, quando desafia o paradigma hegemônico esbarrando-se na soberania nacional. Desse modo, quando se observar colisões dessa natureza, isto é, entre dois mundos distintos, deve-se recorrer, pois, a uma hermenêutica que considere todas as circunstâncias do caso concreto, e perscrute outros ramos do saber com vistas a encontrar uma "ponte" que oriente para soluções.

Urge, no caso em tela, fazer prevalecer a vida em face do costume, contudo, jamais impondo e desrespeitando o direito dos povos, como o querem alguns, ao utilizar de terminologia inadequada – v.g. práticas culturais"nocivas" – que transmite a sensação de que os índios seriam cruéis no exercício de seus costumes seculares, e reforçando a segregação entre os povos.

A interpretação da EC 45/2004 traduz, ao revés, uma áurea de harmonização ao fincar novos horizontes, tanto para os direitos humanos, como para os povos indígenas.21 Para estes, ademais, inseriu o princípio da autodeterminação cujo produto parece surtir efeito v.g. nos atuais conflitos de demarcação de terras, quando setecentos índios acamparam na frente do STF, o que reforça a tese defendida por Will Kymlincka, na qual caminhamos para uma "era das nacionalidades".

Importando ressaltar, enfim, que plantado esses princípios, a defesa da diversidade cultural passa a ser, para os Estados nacionais, um imperativo ético inseparável do respeito à dignidade humana, ainda que questões complexas como as do infanticídio denotem atenção dobrada.

7.0 – Referências

ALEXY, Robert. Teoria de los Derechos Fundamentales. Madrid: Centro de estudios constitucionales, 1993.

ARIZPE, Lourdes (org.). As dimensões culturais da transformação global: Uma abordagem antropológica. Brasília: UNESCO, 2001. 320 p.

BARRETO, Helder Girão. Direitos Indígenas: vetores constitucionais. 1.ed. Curitiba: Juruá, 2004.

CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional. 6ª ed. (revista). Portugal, Coimbra: Livraria Almedina, 1996.

COMISSÂO PRÓ-YANOMAMI. Yanomami na Imprensa. Infanticídio é uma tradição milenar dos yanomami. Fonte: folha de boa vista, 10 de março de 2005. Em: http://www.proyanomami.org.br/v0904/index.asp?pag=noticia&id=3980

DECRETO Nº 5.051, de abril de 2004 – Convenção nº 169 da Organização Internacional do trabalho – OIT sobre Povos Indígenas e tribais.

DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. 1ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 2002.

HUNTINGTON, Samuel, "The Clash of Civilizations?", Copyright Council on Foreign Relations Summer, 1993.

KYMLINCKA, Will. Ciudadanía Multicultural. Uma teoría liberal de los derechos de las monorías. Barcelona, Buenos Aires, México: Paídos, 1996.

MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gounet. Hermenêutica Constitucional e Direitos Fundamentais. Brasília: Brasília jurídica, 2000.

MIRANDA, Jorge. Manual de Direito Constitucional. Tomo II. 3ª ed. Reimp., Coimbra: Coimbra Editora, 1996, (5 Tomos).

PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos: Desafios da Ordem Internacional Contemporânea. 2006.

QUEBRANDO O SILÊNCIO. Um debate sobre o infanticídio nas comunidades indígenas do Brasil. Relatório Atini.

RAMOS, Alcida Rita - Memórias Sanumá: Espaço e Tempo em uma Sociedade Yanomami. São Paulo: Marco Zero; Brasília: UnB, 1990

SOUZA SANTOS, Boaventura de (org.). Reconhecer para libertar: os caminhos do cosmopolitismo multicultural. Rio de janeiro: Civilização Brasileira, 2003.

Notas

1 "(...) a Declaração de 1948 inova a gramática dos direitos humanos, ao introduzir a chamada concepção contemporânea de direitos humanos, marcados pela universalidade e indivisibilidade destes direitos (...)". Flávia Piovesan, Direitos Humanos: Desafios da Ordem Internacional Contemporânea. 2006.

2 Herskovits, maior difusor do relativismo acentuava "o que é considerado direito humano numa cultura pode ser considerado anti-social em outra". A questão étnica: qual a possibilidade de uma ética global? In As dimensões Culturais da transformação social, pág. 54-55.

3 Folha de Boa Vista – Infanticídio é uma tradição milenar dos Yanomami – 10 de março de 2005.

4 Tramita no congresso o projeto de lei 1057, denominado Muwaji dispondo sobre as praticas infanticidas em tribos indígenas, com forte participação da ONG ATINI.

5 Boaventura de Souza santos. Por uma Concepção Multicultural de Direitos humanos. Pág. 429-432.

6 Idem, pág. 440-441.

7 Idem, pág. 442-443.

8 Nesse sentido, Taylor, Charles. El Multiculturalismo y "la politica del reconocimiento". México, D.F: Fondo de Cultura Económica, 1993.

9 Quebrando o silencio. Um debate sobre o infanticídio nas comunidades indígenas do Brasil. Relatório Atini.

10 KYMLICKA, Will. Ciudadanía Multicultural. Pág. 40-43.

11 Idem, ibidem.

12 CARDOSO DE OLIVEIRA, ROBERTO. In As dimensões culturais da transformação global. Pág. 61-62.

13 Cf. especialmente ALEXY, Robert. Teoria de los Derechos Fundamentales, pág. 130-133, e DWORKIN, Ronald. Levando a sério os direitos, pág. 36-50.

14 MENDES, Gilmar. Hermenêutica Constitucional e Direitos Fundamentais. Pág. 181-182.

15 Idem, pág. 282.

16 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional. Coimbra, 6ª ed. (revista). 1993, pág. 228

17 Nesse sentido colhe-se da lavra de Jorge Miranda "Tais contradições hão de ser superadas, nuns casos, mediante a redução adequada do respectivo alcance e âmbito e da cedência de parte a parte e, noutros casos, mediante a preferência ou a prioridade, na efectivação, de certos princípios frente aos restantes – nuns casos, pois, através de coordenação, noutros através de subordinação". Manual de Direito Constitucional. Pág. 191.

18 PROJETO DE LEI Nº 1057 – Lei Muwaji; Dispõe sobre o combate a práticas tradicionais nocivas e à proteção dos direitos fundamentais de crianças indígenas, bem como pertencentes a outras sociedades ditas não tradicionais.

19 Nesse sentido manifesta-se Daniel Sarmento, A garantia do direito à posse dos remanescentes de quilombos antes da desapropriação, (...) "romper os laços de um índio com seu grupo étnico é muito mais do que impor o exílio do seu país para um típico ocidental".

20 Art. 4º. É dever de todos que tenham conhecimento das situações de risco, em função de tradições nocivas, notificar imediatamente as autoridades acima mencionadas, sob pena de responsabilização por crime de missão de socorro, em conformidade com a lei penal vigente, a qual estabelece, em caso de descumprimento: Pena - detenção, de 1 (um) a 6 (seis) meses, ou multa.

21 A convenção 169 da OIT prescreve a tutela das tradições, culturas, crenças, reconhecendo, inclusive seu direito consuetudinário.

Revista Jus Vigilantibus, Quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

Sobre o autor

Gerôncio Ferreira Macedo Júnior

Acadêmico do 4º semestre da Faculdade de Direito da Universidade Católica do Salvador.

2009 – Todos os direitos reservados.

fonte: http://jusvi.com/artigos/37745

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Quando Harry Potter encontra Deus


AP
Capa da edição britânica do livro 'Harry Potter e As Relíquias da Morte'


Michael Paulson
A princípio, o mundo da religião não ficou particularmente entusiasmado com a chegada do menino Potter. Por vários anos, a série Harry Potter, de J. K. Rowling, esteve no topo das listas da Associação Americana de Bibliotecas de livros mais desafiadores (razões citadas em 2001: "antifamília, ocultismo/satanismo, ponto de vista religioso e violência"). Protestantes evangélicos questionavam: a representação positiva da bruxaria desencaminharia crianças? E alguns católicos também estavam preocupados. Do cardeal Joseph Ratzinger (hoje Papa Bento XVI), que alertou que "seduções sutis" no texto poderiam "corromper a fé cristã", ao reverendo Ronald A. Barker, sacerdote de Wakefield que arrancou os livros da biblioteca escolar de sua paróquia.

Mas, nos últimos anos, escritores e pensadores religiosos passaram a se entusiasmar por Harry - tanto a Christianity Today, uma revista evangélica, quanto L'Osservatore Romano, o jornal do Vaticano, elogiaram o último filme. O Christian Broadcasting Network, canal de Pat Robertson, apresenta em seu website uma seção especial sobre A Controvérsia de Harry Potter, que reconhece que "importantes pensadores cristãos têm opiniões muito diferentes sobre os produtos Harry Potter e como os cristãos devem responder a eles".

Ético, positivo e tolerante
Ao mesmo tempo, estudiosos da religião começaram a desenvolver uma abordagem com maiores nuances sobre o fenômeno Potter, com alguns argumentando que a extremamente popular série de livros e filmes contém mensagens éticas positivas e um arco narrativo que vale a pena ser examinado academicamente e até teologicamente.

Os acadêmicos estão interessados sobretudo no que os livros têm a dizer sobre os dois grandes temas de preocupação das pessoas de fé - moralidade e mortalidade -, mas alguns também investigam o que a série diz sobre tolerância (Harry e seus amigos são notavelmente abertos a pessoas e criaturas diferentes), intimidação, a natureza e presença do mal na sociedade e a existência do sobrenatural.

O interesse acadêmico nos livros de Harry Potter começou bem antes do fim da série e não dá sinais de diminuir. Pipocaram livros acadêmicos com títulos tão diversos quanto The Ivory Tower and Harry Potter: Perspectives on a Literary Phenomenon (A Torre de Marfim e Harry Potter: Perspectivas Sobre um Fenômeno Literário) e Harry Potter's World: Multidisciplinary Critical Perspectives (O Mundo de Harry Potter: Perspectivas Críticas Multidisciplinares).

No último outono, a Academia Americana de Religião teve em sua convenção anual uma mesa chamada A Forma Potteriana de Morte: A Concepção de Mortalidade de J. K. Rowling. E há uma grande quantidade de artigos em periódicos religiosos com títulos como Procurando Deus em Harry Potter e Envolvendo-se na Espiritualidade de Harry Potter ou mesmo mais complexos como Harry Potter e o Batismo da Imaginação, Harry Potter e o Problema do Mal e Harry Potter e Bibliotecas Teológicas.

Religião & Cultura Pop
"Existe todo um campo explosivo de religião e cultura popular buscando não apenas paralelos exatos, seja concordando ou contestando crenças religiosas, mas também considerando essas histórias um reflexo das sensibilidades espirituais ou religiosas da cultura", afirma Russell W. Dalton, professor-assistente de educação cristã na Escola Brite Divinity, no Texas e autor de Faith Journey through Fantasy Lands: A Christian Dialogue with Harry Potter, Star Wars, and The Lord of the Rings (Jornada da Fé Através de Terras da Fantasia: um Diálogo Cristão com Harry Potter, Guerra nas Estrelas e O Senhor dos Anéis).

"Quando histórias se tornam tão populares quanto as de Harry Potter, elas deixam de refletir apenas as opiniões religiosas do autor, mas se tornam artefatos da cultura, dizendo algo sobre a cultura que as abraçou", diz Dalton. "E esse é certamente o caso de Harry Potter."

O interesse acadêmico no menino que sobreviveu ao mal faz parte de uma busca maior de escritores e estudiosos da religião por sinais da fé, e em particular por repercussões da narrativa cristã, na cultura. A busca não é nova, embora esteja historicamente concentrada na grande arte - como pintura e literatura. Mais recentemente, jornalistas de religião se voltaram para a cultura popular, escrevendo livros como O Evangelho Segundo os Simpsons, de Mark Pinsky, e The Gospel According to the Coen Brothers (O Evangelho segundo os irmãos Coen), de Cathleen Falsani, enquanto pesquisadores examinam o papel da religião em clipes da Madonna e em séries de TV como Jornada nas Estrelas e Lost.

"Precisamos nos envolver no diálogo que ocorre entre as pessoas", defende Jeffrey H. Mahan, professor de ministério, mídia e cultura da Escola Iliff de Teologia, no Colorado, e um pioneiro no estudo da relação entre religião e cultura popular.

Também existe um longo histórico do uso da literatura infantil como forma de pedagogia religiosa. Amy Boesky, professora-associada de inglês do Boston College, afirma que o uso da literatura infantil para o ensino de valores morais remete a, pelo menos, Erasmo, que escreveu durante a Renascença, e inclui clássicos que vão de O Peregrino, de 1678, a Uma Dobra no Tempo, de 1962. O exemplo mais conhecido são os sete volumes de As Crônicas de Nárnia, escritos no início da década de 1950 pelo apologista cristão C. S. Lewis, que, além de servirem como divertida literatura fantástica, são frequentemente lidos como uma alegoria cristã, sendo o heróico leão Aslan obviamente uma metáfora de Cristo.

Embora alguns acadêmicos agora enxerguem Cristo em Harry Potter, os paralelos são mais sutis e, sem dúvida, amplamente ofuscados por uma torrente estonteante de feitiços mágicos, criaturas estranhas e jogos de quadribol. Harry em si é um complexo herói adolescente, assombrado pelo assassinato de seus pais, por vezes em conflito com seu papel no mundo e confuso, como qualquer um estaria, por sua estranha conexão mental com seu antagonista Voldemort.

"Os livros de Potter não são explicitamente religiosos como as narrativas de Nárnia, mas há a forte presença do mal, e temas do bem e do mal não são apenas filosóficos, mas também questões teológicas¿, observa Gareth B. Matthews, professor de filosofia na UMass Amherst.

Versões de Cristo e Deus
Alguns pesquisadores levam a busca por temas do Evangelho na série Harry Potter bem longe. Oona Eisenstadt, professora-assistente de estudos religiosos do Pomona College, faz uma análise extremamente elaborada, sustentando que Rowling explora a natureza complexa de personagens bíblicos apresentando duas versões de cada nos livros de Potter. os bruxos Severo Snape e Draco Malfoy, argumenta, representam interpretações concorrentes de Judas - ambos buscando a morte de Dumbledore, mas um porque está servindo o mal e o outro porque essa é uma exigência do destino. Eisenstadt enxerga Dumbledore e Harry, cada um à sua maneira, como figuras de Cristo - talvez Harry representando Jesus humano e Dumbledore o divino. E ela acredita que a descrição de elementos da comunidade judaica segundo o Novo Testamento ocorre através dos duendes (banqueiros repulsivos) e do Ministério da Magia (legalista e bitolado).

"Ao invés de oferecer uma alegoria direta, que obriga leitores juvenis a engolir a teologia, Rowling oferece representações dúbias, que são um convite à reflexão para jovens e todos nós", escreve Eisenstadt.

Crítica ao fundamentalismo
Alguns estudiosos de religião parecem mais interessados na série Potter como um comentário social - em particular, eles focam na recusa de Harry em participar da discriminação aos trouxas demonstrada por alguns bruxos e feiticeiros de sangue puro, assim como na hostilidade a gigantes e fantasmas, entre outras criaturas mágicas ameaçadoras, que alguns personagens manifestam. "Um dos temas gerais da série Harry Potter tem a ver com perseguição com base na raça", afirma Lana A. Whited, professora de inglês do Ferrum College, na Virgínia, e autora de The Ivory Tower And Harry Potter. Já Dalton, da Escola Brite Divinity, leva o argumento mais além, sugerindo que a associação de tolerância a personagens heróicos é uma crítica ao fundamentalismo.

"Para Dumbledore e Harry e seus amigos não importa se você nasceu trouxa ou gigante", diz Dalton, "enquanto está claro que os Comensais da Morte, os malvados, são intolerantes às pessoas diferentes deles".

Vozes divergentes
Nem todos os acadêmicos são tão entusiásticos. Elizabeth Heilmant, professora-associada de pedagogia da Universidade Estadual de Michigan e editora do livro Critical Perspectives on Harry Potter aponta que, diferente de Hermione, que abraça a causa dos elfos domésticos, "você nunca vê Harry Potter dedicando-se a uma causa em favor dos oprimidos. Ele é na verdade um herói relutante e não estou convencida de que a narrativa o faz efetivamente ir além de seus motivos pessoais".

O interesse dos estudiosos de religião na série Potter se intensificou com o muito esperado lançamento do sétimo e último livro, Harry Potter e As Relíquias da Morte, publicado em 2007. A questão sobre a possível morte de Harry foi muito debatida antes do lançamento do livro, e não é preciso ter um diploma em divindade para ver temas de sacrifício e ressurreição na resolução dessa questão.

"Lembro-me da espera pelo livro sete e das conversas com meus filhos sobre se Harry Potter iria morrer e muitas dessas conversas envolviam até que ponto Rowling faria dele um livro cristão: será que Harry vai morrer e salvar o mundo?", diz Stephen Prothero, professor de religião da Universidade de Boston.

O desfecho da história (alerta de spoiler!) é o ponto de partida para muitos estudiosos de religião, porque nas cenas finais, Harry compreende "que sua função era caminhar calmamente em direção aos braços acolhedores da Morte", escreve Rowling. Harry permite que ele seja morto - ou pelo menos atingido por uma maldição fatal - para salvar o mundo da feitiçaria, mas depois retorna à vida, encorajado por uma visão de Dumbledore que lhe diz: "retornando, você pode garantir que menos almas sejam mutiladas, menos famílias sejam destruídas". Harry então vence Voldemort e, segundo a descrição do livro, é visto pela multidão que testemunha a batalha final como "seu líder e símbolo, seu salvador e seu guia".

"No final do último livro, temos um Potter agonizante que ressurge - ele precisa ser morto para livrar o mundo do mal personificado por Voldermort", diz Paul V. M. Flesher, diretor do programa de estudos religiosos da Universidade de Wyoming e autor do artigo sobre Harry Potter para o Journal of Religion and Film. "Existe um padrão cristão nesta história. Não é apenas o bem contra o mal. Rowling não está sendo evangélica - isso não é C. S. Lewis -, mas ela conhece tais histórias e está claro que ela junta as peças de uma maneira que faz sentido e que ela sabe que os leitores vão acompanhar."

Escritora confirma analogia religiosa
A própria Rowling, após a publicação do livro final, disse acreditar que os temas religiosos haviam "sempre estado óbvios", e os acadêmicos observam pelo menos duas citações não nomeadas do Novo Testamento na série, uma no túmulo da mãe e irmã de Dumbledore ("Porque onde estiver o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração", Mateus), e uma no túmulo dos pais de Harry ("Ora, o último inimigo a ser destruído é a morte", 1 Coríntios).

A última batalha de Harry com a morte consolidou o romance entre acadêmicos de religião e a série de Potter, com as controvérsias iniciais a respeito de varinhas e bruxaria sendo ofuscadas pela discussão do caráter de Harry e suas escolhas de vida.

"Ao invés de condenar certos elementos da série como malignos - algo que muitos cristãos fizeram -, devemos convidar nossas comunidades a apreciar mais profundamente tanto as similaridades quanto os contrastes entre as histórias e nossa fé cristã", Mary Hess, do Luther Seminary de Minnesota, escreve no periódico Word & World.

De fato, Leonie Caldecott, escrevendo no Christian Century alguns meses após a publicação do sétimo livro, opina: "Como é revelado em Relíquias da Morte, longe de enganar a morte, Harry deliberadamente abraça a morte quando finalmente entende que isso é necessário para salvar os outros, e não apenas aqueles que ele particularmente ama."

Dumbledore, no início da série, deixa claro suas próprias visões sobre o tema, dizendo: "Para uma mente bem organizada, a morte é apenas a próxima aventura."

Na conferência da Academia Americana de Religião, os participantes exploraram a cena final, bem como outras ilustrações da morte na série de Potter, buscando por significados. Paul Corey, professor de estudos religiosos da Universidade McMaster, do Canadá, retoricamente perguntou: "Qual é a diferença entre um cristão e um Comensal da Morte?". Este foi o ponto de partida para refletir sobre como a busca de Voldemort para vencer a morte poderia diferir de, ou se assemelhar, ao desejo cristão pela vida eterna no paraíso. E Lois Shepherd, especialista em bioética da Universidade da Vírginia, disse que encontrou na série um argumento contra o prolongamento da vida física a todo custo - uma rejeição ao que ela chamou de "busca para evitar a morte" que, segundo ela, foi representada pelo debate sobre Terri Schiavo no mundo real.

"A morte, na filosofia da série, não deve ser temida", Shepherd diz. "Na verdade, são aqueles que mais temem a morte - Voldemort sendo o exemplo supremo disso - que se envolvem em atos inomináveis de maldade."

The New York Times

fonte: http://diversao.terra.com.br/interna/0,,OI3942631-EI3615,00.html

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Marina, PT e Senado fazem Lula se destacar enquanto símbolo

Apolo Heringer Lisboa

A saída da Marina não foi por causa da crise do Senado nem de uma postura moralista, alega ela divergências de projeto para o país, e aí dá ênfase na questão sócio-ambiental. Trata-se de uma entre milhares de militantes que confiaram num Partido dos Trabalhadores transformador e ético e em Lula sua liderança. Muitos sairam antes de Marina, ela demorou muito. Por que? Ficou neutralizada na época do Mensalão; fez coisas inaceitáveis, talvez constrangida e achando que seria a última vez ou que poderia relativizar os danos, como na questão dos transgênicos. No governo mudou e apoiou a transposição do São Francisco de forma clara. Tenho livro organizado pela Marina Silva desancando a transposição em termos de denúncia moral grave aos seus propositores. Depois aceitou o desmembramento do Ibama com a finalidade de reduzir a força dos biólogos e ambientalistas em favor da burocracia admjnistrativa nomeada. Não se manifestou em relação aos projetos das canalizações sistemáticas dos córregos e ribeirões urbanos, aprovados pelo PAC às empreiteiras irresponsáveis, e que irão produzir enchentes urbanas em todo o Brasil. Estas canalizações aparentemente inocentes perenizam a destruição dos rios com altos custos ambientais e de manutenção , como mostra o modelo implantado em São Paulo. Fazem isto como se fosse necessário para obras de saneamento. Mas a realidade é que visam construir avenidas "sanitárias" e atender à especulação imobiliária. Todas as margens dos rios e ribeirões poderiam ser parques naturais com modificações paisagísticas para o lazer urbano. Marina teve uma visão da questão ambiental muito amazônica, foi usada como escudo de proteção do governo e para efeitos internacionais. Mas trata-se de uma grande pessoa, com currículo de superação. É uma companheira respeitável, apesar dos erros cometidos.

Mas na política partidária e na administração dos negócios de Estado Maquiavel foi perspicaz. Há uma diferença entre ética e eticismo. Apesar de não aceitar certas atitudes do Lula e não praticá-las em minha vida privada, ainda que com incremento de minhas dificuldades pessoais e familiares de sobrevivência, não posso ser tão duro a ponto de acusá-lo de desonesto, muito menos de corrupção. Numa conversa pessoal poderia dizer-lhe que tem uma pequena multidão de pessoas, sobretudo dentro do PT, se aproveitando da situação, sem nenhum compromisso histórico com a população. Mas é claro que ele sabe disso, então falar o quê mais? Os assuntos acabaram ! Resta saber se esta opção foi imperativa ou aleatória.

Considero ética a liderança do Lula. O que entende-se por ética? Acompanhei sempre sua trajetória, trabalhador incansável da mobilização social, falas contraditórias com a realidade atual do seu governo, as inevitáveis cabeçadas. Para comparar, acho o respeitabilíssimo Eduardo Suplicy eticista. Assisti esses dias o Suplicy ao lado do senador Agripino Maia, sendo entrevistado na Globo News pela raposa do jornalismo Alexandre Garcia sobre a acareação da Dilma no Senado com a funcionária da Receita Federal. O Agripino emocionado falava e rolava de ética, elogiando o Suplicy como "homem de bem" e o Suplicy orgulhoso, dizendo: "sem dizer a verdade não há justiça! Quero a acareação"!

Se o Suplicy não fosse eticista, mas ético competente diria: "agradeço a menção a meu comportamento pois sempre fui coerente; mas vocês, Agripino, não têm história para falar de ética." Embora o PT já não comporte mais este discurso imagino que o senador cumpre conscientemente um papel. O Suplicy se comporta como um quichote eticista. Ninguém duvida de sua honestidade. E sabe que está convivendo entre pessoas de alta periculosidade. Mas não conseguiria governar estando na presidência do país.

Precisa ficar claro que a ética não é monopólio dos santos. Os bandidos são altamente éticos: quem não paga a droga morre; quem estupra morre! Nem o discurso ético garante a ética. Pinochet derrubou Allende fazendo o discurso da defesa da democracia e da ética no Chile. Aqui, em 1964, os generais fizeram este discurso da ética, com a UDN à frente. Muitos dos atuais éticos estavam no poder com a ditadura, quando na surdina a corrupção mais cresceu no Brasil. Era a época da ARENA e mais tarde do PDS, sob a batuta do senhor Sarney ! Querem mais ético, no sentido assumido por este termo, que o PT na oposição em seus primeiros anos? Fazia o mesmo discurso da Heloisa Helena!

Até a eleição do Lula só a elite tradicional mandava e desmandava, praticando todo tipo de crime contra o povo. Tirando o período do Getúlio cujo trabalhismo promoveu uma nova "elite" de descamisados morenos somente com o Lula este processo retomou o fôlego, com a promoção de sindicalistas e líderes de base às esferas governamentais. Hoje está tudo mais democratizado, situação natural numa sociedade onde o reino fisiológico da necessidade dificulta demasiadamente a transcendência da sociedade para o mundo da consciência filosófica e de si, no reino da construção culta. A barriga soa mais alto nas decisões, é questão de estágio evolutivo! A base de apoio ao governo federal e o PT, têm pouca preocupação ou nenhuma com serem rigorosos com o dinheiro público e atitudes dignas. Não têm aqueles "pruridos " dessa honestidade caseira na qual muitos de nós cresceu e que servia paradoxalmente para proteger as elites no poder! Este papel era bem feito pela catequese religiosa tradicional, rompida parcialmente pela chamada teologia da "libertação". A velha elite com raízes na Colônia, na Escravatura, nas Bandeiras e no Café, que sobreviveram na República, está agora mamando menos, estão "indignados". Bom exemplo de luta de classes à foiçada! A política de Estado é a continuação da guerra por outros meios e a guerra continuação da política. Teria sido afirmação de Clausewitz, autor de Sur la Guerre?

Para manter a elite dividida e o equilíbrio político no Congresso, que dá governabilidade, o Lula precisou fazer alianças espúrias com o PMDB de Sarney, Renan e Jader Barbalho, com a turma do Maluf e até do Collor, ou seja, com os considerados cachorros mortos ou em vias históricas de o serem, mas com dentes ainda afiadíssimos. Este pessoal achava o Lula o Diabo, agora o tratam como um Santo! Vejam como as coisas da vida são sutis. E Lula tem total controle sobre o PT pelas mesmas razões, que Darwin tão bem entendeu. Aí que está o segredo da alma humana e da sua relação com o ID de Freud, idéia que transitou na Vontade de Schopenhauer e na Coisa em Si de Kant. A lei natural do processo de sobrevivência pela adaptação e seleção dos mais aptos, no caso os mais espertos, não distingue entre petistas, pemedebistas, tucanos ou demos! Esta Vontade ainda o fazem cumprir papéis sociais importantes nesta compostagem. Neste sentido Lula é um artista genial. Sua transigência moral no governo poderá engrandecê-lo ao romper com a moral ensinada aos humildes cuja honestidade serviu para perpetuar no poder as elites corruptas. Estas elites sempre monopolizaram este eficaz comportamento transgressor das lições éticas e morais ensinadas pelas religiões no processo da dominação política que exercem. E ainda eram "abençoados por Deus" como legítimos representantes. No Salmos e Hinos da Igreja Presbiteriana a canção 200 cantada pelos fiéis era nada mais nada menos que o Hino Nacional Inglês Imperial. Eu o sei cantar de memória e olhando para o Céu!

Certamente a gestão petista irá criar escola no país. Terão sido rompidos os limites morais que se imaginava existirem na vida pública, fenômeno já tão comum na vida privada. Terá surgido uma nova visão proletária da ética e da moral, rompendo o monopólio da burguesia em tecnologias de dominação?

Não se explicaria assim o apoio ostensivo e declarado do governo comunista chinês ao golpe militar de Pinochet em 1973 e da União Soviética à ditadura militar argentina, neste mesmo período, por razões comerciais similares em meio à disputa sino-soviética?

A verdade é que o desempenho do PT nesse campo está humilhando seus velhos adversários hoje transformados em aprendizes apoiadores e dependentes nas horas difíceis. Estão tendo um enterro de primeira! O PT deve ter sido convencido de que para derrotar a burguesia precisaria aprender a usar essas armas, infalíveis eleitoralmente e na manutenção do poder institucional. Para essa gente que tanto nos combateu o único crime eleitoral era perder uma eleição! Como diziam meus familiares, aprender as coisas más é mais fácil que trilhar o estreitinho caminho das virtudes.

Com esta compreensão de que os fins justificam os meios, visão aceita pela a população, o PT demonstra competência política maquiavélica. A linha de José Dirceu triunfa sobre o sentimento ingênuo fundador do PT, de que a luta dos oprimidos pelo exercício do poder de Estado seria uma vitória "ética" de um São Jorge esmagando o Dragão da Maldade. Esta representação ainda está presente, ela é ideologicamente necessária ao PT, pois é preciso ter a Moral do nosso lado! Daí a importância dos éticos do PT na representação! "shakespeariana" dos papéis. O Brasil está ajudando o mundo a conhecer melhor a alma humana. Mais uma contribuição histórica do PT: agora entendo melhor a afirmação que ouvia nos tempos de minha militância : os movimentos não têm coração !

O Lula e o PT precisaram atravessar o Rubicão e foram além do suportável pela maioria dos militantes de esquerda com preocupações morais. Para cada coisa tem um talentoso. Por isto existem os Berzoines, os Delúbios, e outros. É o papel de cada um no teatro da vida. Ainda assim, nesta abordagem da política de Estado, onde é necessário dividir para governar e onde os discursos todos estão no campo da falsidade, o que interessa é o poder nas mãos, ainda que negando os projetos "infanto-juvenis" do programa original do PT, o nosso antigo catecismo. As velhas elites nos diziam e nos educaram dizendo: "este PT seus é ingênuo, vocês são idealistas! O Lula está usando vocês, tem até mansão no Morumbi. Vocês irão ver"! E nos ridicularizavam. Só não esperavam ser tão surpreendidos pelos ingênuos de duas décadas atrás. Neste sentido acho que o Lula é ético e comete ou engole coisas que exige um super estômago, em defesa do que acredita ser o melhor para o povo. É muito inteligente para querer ser corrupto no sentido vulgar do termo. Só se fosse um depravado, o que não se adequa à sua história de superação. Enquanto pessoa e líder não precisa disto, goza de prestígio, terá sempre aposentadoria e segurança pessoal, sempre será a estrela enquanto ex-presidente com notável biografia.

Inteligentíssimo, o Lula é um estadista, não é da tralha dos seus "aliados" vorazes ou mesmo da maioria dos seus atuais companheiros de legenda, como pensa a direita. Para eles não interessa a ética abstrata suplicyana, interessa os resultados. E o povo que sustenta o governo se interessa por ganhos reais como como bolsa família, aumento do salário mínimo, mais empregos, cotas nas universidades! e aumento de vagas, sem entrar aqui no mérito destes ganhos que podem ter outras interpretações e consequencias. A maioria do povo continua sendo manipulado por pão e circo. Por isso a prioridade não foi a escola pública de qualidade e universal, sim o Bolsa Família. Maquiavel poderia dizer se aqui estivesse: nada melhor para a governabilidade que ser pai dos pobres e mãe dos ricos ! Esta fórmula possibilitou a Lula desenvolver a abertura da política e do comércio externo e tirar a discussão do embate esquerda versus direita. Muito parecido com Getúlio. Mas mais bem sucedido. Conseguiu se safar dos golpes militares que as elites tradicionais sempre praticaram como a ética do poder. O Lula não tem vocação para mártir nem é masoquista, como a direita teria preferido e era a tradição romântica da esquerda. A direita odeia Fidel Castro pois ele também usou as armas tradicionais dos opressores e se manteve à frente do seu povo sem cumprir com o que os norte-americanos queriam. O processo o fez mudar. Como diria o Joaozinho Trinta: o Lula gosta é de coisa boa, de luxo, de poder. Por esta a direita não esperava. Encontrou uma esquerda à sua altura.

Para o povo, esta situação que o beneficia neste momento é ética também. O povo aceita políticas anti-ambientais como a do Blairo Maggi em Mato Grosso, aceita desmatar a Amazônia, aceita acordos com o agro-negócio, proteção a banqueiros, escândalos e aceita que o Lula faz isto para segurar o trem nos trilhos, senão ele cai. O povo vê a corrupção como natural, quer o Lula firme no Planalto, deverá eleger seu sucessor, pois está dando conta de alimentá-lo. Esperou somente 500 anos para ter Getúlio e depois o Lula. Veja como não se abalou com as denúncias do Mensalão e reelegeu o Lula, independente do lacerdismo de Arnaldo Jabor. E o povo não é bôbo: sabe que o Lula sabia de tudo e até ri da esperteza dele entre uma pinga e outra. Os moralistas não entendem o povo. O povo está acostumado com todo tipo de sacanagem e não acredita que os políticos irão acabar com ela. O povo precisa ser fisiológico para viver, a não ser que troque eternamente esta vida pela promessa incerta da outra no Além. Luto para que um dia este povo sacrificado para produzir dinheiro para os ricos irá ascender ao reino das idéias e frequentar universidades, restaurantes, hotéis, praias. Poderá até ser cremado!

Filosoficamente, o povo é cínico e o Lula também, no sentido de não terem as ilusões "pequeno burguesas" de honestidade nem acreditar nesses discursos éticos que se sustentam na oposição. Como ensinou o filósofo escocês David Hume nos anos 1700, aqui interpretado nas minhas palavras: "a moral é utilitária; moral é o que é bom para nós!" As opções éticas das pessoas e dos partidos são pragmáticas e o comportamento moral é complacente como talvez certos hímens. O código moral perfeito e eterno só existe na cabeça da indústria da fé que não raciocina historicamente. Os partidos e os governos querem o poder do Estado, eles miram-se nos resultados para a continuidade; agora só pensam na vitória em 2010 e nas alianças para isto. O resto é o resto. Todos estão mentindo e se mimetizando dentro dos oratórios. O Lula tem coragem e raça de enfiar a cara nesta coisa que nos choca tanto. É cabra porreta. Foi criado na rua, sem mimos, é todo calejado, dá aula a muitos doutores avoados.

O risco de Lula ter uma imagem histórica negativa por causa disto é muito pequeno. Imagine agora o DEMO vencendo em 2010 coligado com o PMDB, ou o PSDB do senador Arthur Virgilio e em nome da ética? É disto que o povo tem pavor: repetir FHC, repetir Carlos Lacerda, que Canudos volte a acontecer. Um velho fazendeiro salinense, que conheci menino, desiludido com a política local disse que às vezes é preferível deixar a cachorrada gorda continuar mais um pouco no poder que trocá-la pela cachorrada magra, e o povo ter que trabalhar dobrado para engordá-la. Isto tem acontecido sucessivamente na chamada "rotatividade democrática", de eleições cada vez mais venais e um povo desinformado pela mídia de negócios.

Eu estou há mais de uma década longe de qualquer vínculo partidário, pois não consigo ser ético no sentido que descrevi aqui. Sempre que cometi algum deslize fui impiedosamente castigado por minha consciência. Tenho capacidade para ver e compreender a vida como ela se se quiser ser bem sucedido nesta vida! Mas não consigo praticar meus conhecimentos. Tenho um defeito congênito que me amarra ao eticismo, ao amadorismo, posso até ser simplório, portanto impróprio para partidos e eleições. Vou velejando só pelos meus mares tentando ser fiel à educação que recebi em casa e sem força e querer para ser diferente. Mesmo não crendo mais no Céu lá no Alto! Na esperança de recompensas futuras! Gosto muito de ler Cervantes. Sou político até a medula mas não sou propício a ser peça partidária, nem a líder deste Reino, e muito menos a ser cabo eleitoral. Foi uma pena não ter nascido daqui uns mil anos. Acredito que teria mais chances de concordar com mais coisas.
Quanto à Marina que se cuide no PV. O PV não é programático nem respeitado. Pelo que vejo e escuto não passa de um partido de programa, com todo respeito às mocinhas e rapazes das esquinas e das noites. Ela não vai resolver os problemas que tinha no PT. A Marina precisa se reciclar de suas idéias juvenis e se ajuntar àqueles que buscam compreender a verdadeira dimensão da política prática. Ela tem mais um espírito missionário. Precisamos meditar juntos para encontrar a inspiração e uma proposta de ação coerente com a realidade aqui descrita.

Será que não há uma alternativa nova, extra partidária, inteligente e com arte e transformação, e na paz? Fiquei muito esperançoso com a eleição do Obama e continuo com boa expectativa. Vamos ver. É preciso ter atitudes individuais. No Brasil há liberdade, faltam atitudes. É muito cômodo ficar de vítima e chorando. Será que um dia a gente vai poder viver melhor, ser transparente e com solidariedade? Será possível ocupar um cargo de direção política sem transgredir os "dez mandamentos" ? Eu espero que um dia, com a população se libertando do Reino da Necessidade, nós teremos uma sociedade onde se possa viver socialmente de forma decente. Sem medo. Estamos numa "pré-história".

Belo Horizonte, Agosto 2009