Postado por Ultimatoonline em 22 de novembro de 2010 às 8:21 em Especial Lausanne III | 6 Comments
[1]Especial Lausanne III – Carta lida por Key Yuasa, brasileiro de origem japonesa, pastor da Igreja Evangélica Holiness da Liberdade em São Paulo, no último dia de Lausanne 3 (24/10) no Auditório n. 1 do Convention Center do Cape Town, onde se reuniam todas as delegações ao sul de Sahara, neste momento presidida pelo Arcebispo Henry Orombi da Uganda.
Amados irmãos e irmãs do grande continente da Africa:
Nós os participantes brasileiros de Lausanne III temos sido abençoados abundantemente neste Congresso e estamos muito felizes de estar nesta parte do mundo. Os navegadores portugueses do século XV venceram os temores e as dificuldades naturais do Cabo das Tormentas, e abriram o caminho do comercio para Moçambique e para as Índias. Aqui eles ganharam inspiração, ousadia e coragem para explorar o Oceano Atlântico Sul e procurar chegar às Índias ainda que fosse “por mares dantes nunca navegados” avançando para o oeste, e Pedro Alvarez Cabral oito anos depois de Colombo foi capaz de “descobrir” a Ilha de Vera Cruz, depois rebatizada de Terra de Santa Cruz, quando perceberam que não era ilha, e depois terra do Brasil.
Ao re-lembrar esses fatos da formação de nossa terra e nação, não podemos deixar de recordar nossa grande dívida histórica, moral e física para com o grande continente da Africa, seus povos e nações. Depois da descoberta e por quase 400 anos do Brasil colonia e Brasil independente, nós dependemos do trabalho escravo para a formação de nossas plantações, para cavar nossas minas, para a construção de nossas casas, nossas cidades e nossa nação. Assim cometemos o pecado de sequestrar pessoas deixando atrás muitos órfãos, destruindo casas e vilas causando feridas profundas em suas nações.
Cometemos o pecado de homicídios, de tratar pessoas criadas à imagem de Deus como bestas, impondo em seus povos violência física, psicológica e moral e condições sub-humanas de vida; cometemos abusos de todos os tipos e sempre que foi possível ajudamos a destruir suas identidades pessoais, familiares, culturais e nacionais.
A dívida moral que nós temos em relação as suas nações e povos é tão vasta, profunda e enorme, que nem começamos a medi-la. Cremos que é uma dívida impagável.
Se nós quiséssemos mostrar que realmente sentimos muito pelo que aconteceu e que estamos arrependidos desse pecado histórico de nossa nação em contra de vossas nações, nos teríamos de vir até vocês e dizer: Por favor dá nos a graça de sermos seus escravos. Sejam por favor nosso patrões e nossos senhores, e dá-nos a oportunidade de servi-los. Deixa-nos ajudar a construir suas fazendas, cavar suas minas, construir suas casas e cidades com nosso suor, sangue e lágrimas como gentes do seu povo fizeram por nós. Permitam que nossos corpos sejam enterrados anonimamente embaixo de suas estradas e cidades, como fizeram os vossos povos por nós.
E então, somente então, poderíamos perceber que somos irmãos e irmãs de sangue , porque o seu povo derramou sangue por nós e nos abençoou, e vocês nos teriam dado a graça e a oportunidade de derramar nosso sangue em favor de vocês. Talvez depois disso poderíamos começar a entender juntos a amplidão, o comprimento, a profundidade, e a altura do amor de Cristo que derramou por nós ambos o seu precioso sangue e derrubou o muro de partição para nos fazer uma só família n’Ele!
Mas hoje precisamos pedir a vocês, perdão a algo imperdoável. Por favor perdoem-nos. Por favor perdoem os pecados do nosso povo contra vocês. Perdoem os pecados de nossa nação contra as nações de vocês.
As gentes provindas da Africa em uma imigração forçada, ajudaram a construir o nosso país não apenas com suor, trabalho árduo e sangue. Esta pessoas e seus descendentes tem construído com suas mãos, sua cabeça e pernas (como Pelé, Ronaldo, Robinho, etc.), com coração, mente e sentimentos cálidos como muitos músicos, romancistas e artistas, ou com habilidades técnicas como médicos, engenheiros, juristas, políticos, em todas as esferas da atividade humana. Muitos são membros de igrejas, e com sua fé , esperança e amor tem sido pastores, bispos, professores,líderes e santos. O seus povos e seus descendentes tem sido uma benção para a nossa nação. Em vez de devolverem o mal que receberam com o mal eles tem abençoado a nós com a riqueza de sua música, enriqueceu a nossa cultura alimentar com sua contribuição, e sobretudo com a sua maneira rica e peculiar de ser humano, de ser gente, um próximo e irmão de alma, como estamos experimentando esta semana com vocês. Seus povos e descendentes se tornaram parte integral de nosso país, e de nossas famílias. Muitos de nós nos orgulhamos de ser em certa medida, descendentes dos povos da Africa.
Por favor aceitem-nos como seus servos e servas, seus escravos e escravas em nome do Senhor Jesus. Com amor e ternura fraternais,
(Seguem 59 assinaturas)
Participantes brasileiros em Cape Town 2010
Cape Town, 24 de Outubro de 2010
Crédito foto: Lissânder Dias. Legenda: Pr. Key Yuasa abraça líder africana após ler pedido de perdão.
Artigo impresso de Blog da Ultimato: http://ultimato.com.br/sites/blogdaultimato
Endereço do artigo: http://ultimato.com.br/sites/blogdaultimato/2010/11/22/pastor-japones-le-para-delegacao-africana-um-pedido-de-perdao-da-igreja-brasileira/
Endereços neste artigo:
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Em reação aos comentários do blog do Ultimato, registro a minha:
Creio que a delegação brasileira agiu corretamente. Sim, pessoalmente eu não comprei escravos, e apenas muito indiretamente fui beneficiado pela escravidão. Mas toda a sociedade brasileira o foi, indiretamente. Muito indiretamente eu fui.
Caso estivesse presente, assinaria o pedido de perdão, reconhecendo estes fatos.
Como já foi comentado, o pedido implica em revisão de pontos de vista, em modificações de atitudes. Quais serão, o momento histórico individual e coletivo apresentará oportunamente.
Acrescento que a igreja ocidental também deve pedir perdão aos povos orientais que foram por nós colonizados. Se o Evangelho encontra dificuldades naquelas paragens, parcialmente a conduta de nossos antepassados que misturaram evangelização com comércio e a salvação com lucros é responsável. Foram cristãos que massacraram os árabes na queda de Jerusalém na primeira cruzada; foram cristãos que deceparam a mão de africanos "rebeldes" no assim chamado "Congo Belga"; são cristãos os países que se enriqueceram com as colônias e hoje recusam seus cidadãos.
Não vivemos em um mundo perfeito, mas é parte de nossa vocação curarmos as feridas que podem ser curadas, limitar as que podem ser limitadas e procurarmos não abrir outras.
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