sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Debate sobre camisinha é barulho por nada

LUIZ FELIPE PONDÉ
COLUNISTA DA FOLHA
Sempre me espanta o fato que se dá tanta atenção ao que o papa diz. Não porque ele não seja uma figura importante (no caso de Bento 16, também um teólogo importante), mas porque muita gente que faz barulho com o que fala não se diz católica.
Afinal, por que tanta atenção? Talvez haja aí algo que a psicanálise possa responder: trauma com o pai? Ser contra a "camisinha" inviabiliza sua distribuição no mundo? Custo a crer que a fala da igreja diminua em uma dezena sequer o número de camisinhas acessíveis. Acho muito barulho por nada.
A Igreja Católica é uma instituição antiga e sábia. Gente mal informada pensa o contrário. Esteve em muitas trincheiras ao longo de 2.000 anos, salvou gente, matou gente. Espírito e corpo, como todos nós. Teve e tem um papel civilizador essencial.
Acho um erro quem considera possível descartar a posição da igreja para com "hábitos sexuais contemporâneos" de forma ligeira como se fora simples "atraso".
Frases como "o mundo avançou muito" são normalmente indício de superficialidade analítica. Homens e mulheres continuam atolados nos mesmos dramas de amor, ódio, sexo e morte.
O foco da igreja deve ser a humanização da sexualidade, o que significa basicamente que se sexo é barato e amor é caro, o primeiro sem o segundo sempre corre o risco de ser degradante.
Neste sentido, o uso da camisinha é apenas paliativo no combate a comportamentos sexuais promíscuos que aprofundam a contaminação com doenças sexualmente transmissíveis (DST).
A melhor forma (todo mundo sabe) de combater DST é a mudança de comportamento sexual (tornar o sexo "mais caro" ao afeto).
Mas isso ninguém quer pensar porque é "feio" dizer que a "vida como balada" é um beco sem saída. Mas é exatamente aí que a igreja destoa e por isso se torna essencial, para além das crenças de cada um.
O pecado da Igreja Católica nesses assuntos é "elevar" demais o nível do debate, saindo do senso comum que é simplesmente achar que sexo se resolve "lavando o corpo com água".
A igreja condena o pecado, mas não o pecador. Aceitar o uso de camisinhas em casos de prostituição pode ser apenas uma forma de "misericórdia" pelo coitado sexual que "vende" seu corpo como escravo.
publicado Folha de São Paulo no dia 25/11/10 - disponível para assinantes em http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft2511201006.htm

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Bioética e Fé Cristã n 3 ano V

Biblioteca
Bioética em tempos de crise
Oficina III Congresso Evangélico Nacional de Profissionais de Saúde

Biblioteca
A Ética Cristã, o Moralismo e o Amor
Ao sugerir que se falasse sobre ética e vida cristã nós, jovens, pensamos a
priori em uma conotação onde se colocasse num paralelo a ética e a moral, avaliando aquilo que tange a vida do cristão, definindo-o como tal e como emergem questões referentes à coerência entre discurso e ação.

Biblioteca
Islam y Bioética
Los principios fundamentales desde una óptica islámica son el respeto a la integridad física y psíquica, y la
conservación de la perennidad genealógica y de la filiación

Biblioteca
Bioética e Crença Religiosa: estudo da relação médico-paciente Testemunha de Jeová com Potencial Risco de Transfusão de Sangue
Tese apresentada à Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo para Obtenção do Título de Doutor em Ciências
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Editorial

O Tempo

Tenho me visto tão escravo do tempo, ou da falta dele, que resolvi escrever um pouco sobre isso e sobre o quanto perdemos ao longo do caminho.
Quando começamos a edição deste sítio virtual, cinco anos atrás, não imaginávamos alcançar um grande público, pois sabíamos da complexidade dos temas que queríamos discutir. Não almejamos platéia, buscamos antes de tudo fazer a voz cristã ser manifesta, para quem queira ouvir, de maneira equilibrada e sem a carga emocional que normalmente acompanha certas discussões. Não temos as respostas em termos absolutos, sabemos com absoluta certeza as questões que nos incomodam.
Observamos a comunidade cristã sempre hasteando a bandeira da certeza e da convicção para uma sociedade que busca respostas. Àqueles que neste momento pensam em como pode haver razão, pensamento associado à fé, eu cito o verso "Antes, santificai ao Senhor Deus em vossos corações; e estai sempre preparados para responder com mansidão e temor a qualquer que vos pedir a razão da esperança que há em vós".
Imaginemos um cenário: uma mulher, agredida e violentada; uma gravidez resultado de inominável violência. Agora, imagine que isso acontece todos os dias em vários lugares do mundo, e, certamente, perto de você. Uma pergunta: "Pastor, eu posso abortar?". Não ousaria discutir a questão do ponto de vista desta mulher: seu sofrimento, dor, vergonha, feridas físicas e emocionais. Convido-os a pensar na questão do lado desta liderança. Quando penso nas implicações da resposta a se oferecer, se esta for sincera e responsável. Não se trata de um simples sim ou não, trata-se de estar disposto a, como líder, caminhar com esta mulher todo o caminho; assumir junto com ela a parcela do peso que possa ser compartilhado.
Quero saber o que a comunidade cristã tem a dizer quando temos que nos posicionar sobre pesquisa com células embrionárias, eutanásia, ou qualquer outra questão Bioética.
Há que se ter tempo. Tempo para orar, buscar a Deus, ler, aprender, ouvir. Tempo para despir-se dos próprios conceitos e aceitar que os "pensamentos de Deus são maiores que os nossos". É preciso tempo.
Sobre nossas atualizações, consegui melhorar a programação da página para tornar as atualizações mais fáceis. A partir desta edição, podem contar com atualizações regulares a cada período entre trinta a quarenta e cinco dias.
Convido-os as se juntarem a mim na melhor administração do tempo. 'Ele' veio para que fôssemos livres, inclusive da escravidão do tempo.
Paulo de Castro

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

O limite ao consumismo

Pablo Bastos

Transpor limites, vencer obstáculos, superar adversários e extrapolar barreiras são expressões muito utilizadas como estratégias para atrair pessoas a consumirem. A todo tempo estamos em contato com um mundo que nos desafia a ir além, mas esta promessa não nos diz além de que, ou onde, buscamos ir, e tão pouco nós mesmos o sabemos. Já falei outras vezes sobre a dinâmica do desejo, que jamais acaba em alguma realização, sempre há um porvir, algo maior a ser buscado, outro limite a ser superado! E, assim, acabamos por esquecer a justa importância dos limites. Algumas coisas simplesmente demandam um ponto máximo de alcance, e o maior dos exemplos é a vida, evidentemente todos nós ansiamos pela vida eterna, mas Deus estabeleceu ponto final à vida de todos nós, aqui na Terra, e devemos aceitar isto da melhor forma possível.
Os caminhos e o mundo estão ganhando formas circulares, que nos conduzem a acreditar determos o poder de enganar o fim, ao o emendarmos em um novo começo. Isto se reproduz em momentos simples do nosso dia a dia, exemplo disto é que não há mais um filme de sucesso lançado na última década que não tenha uma continuação. Os finais deixaram de ser esperados com grande expectativa pelo encerramento, e deram lugar à ansiedade pela continuação. O fim que tanto nos assombra tem sido ocultado por pessoas que desejam vender, e para isto fazem insinuações que convergem com o nosso desejo em não termos limites, mas as pessoas veladamente do luto! O homem deseja com todas as suas forças não ter limites, seja limite de poder, do cartão de crédito ou de chances de fazer algo melhor e principalmente que a sua vida não tenha limites, pois assim pode ignorar a sua impotência inata diante do inevitável fim. Mas não adianta fugir, está escrito na Palavra que nós tornaremos à terra, ao pó, ainda que passemos toda a nossa vida ignorando esta máxima: “no suor do teu rosto comerás o teu pão, até que te tornes à terra; porque dela foste tomado; porquanto és pó e em pó te tornarás.” (Gênesis 3:19)
O consumo desenfreado está relacionado à tentativa de ocultar a inevitável chegada do término, revelando ansiedades e causando angústias de desejo e busca. Mas acontece que vivemos em um planeta onde os recursos, diferente do que dizem as promessas de satisfação eterna e incondicional, são esgotáveis e devemos sim nos preocupar com isto, pois o fim dos recursos está evidentemente ligado ao nosso fim. Os impactos da falta de limite, do conforto e do consumo acima do meio ambiente tem se mostrado lentamente, já se sabe que o mundo funciona de uma forma relacional, ações isoladas produzem conseqüências globais. Eu não vou negar que os limites, bem como o luto, também não me agradam muito, todos desejamos uma infinitude de coisas, trazemos permanentemente conosco a idéia de que é melhor sobrar do que faltar, mas ignoramos que o fato de sobrar, hoje, pode provocar a falta no futuro. Comprar é algo muito bom, gratificante, e movimenta a economia do país, mas devemos ser responsáveis e conhecer os pontos que não convém ultrapassar, pois assim acabamos quebrando uma harmonia que há entre nós e o lar que Deus nos deu. Antes do consumo, devemos pensar no cuidado, o primeiro passo é a reflexão e em seguida pode-se pensar em outros fatores como a reutilização, a reciclagem e a redução do consumo, portanto façam esta reflexão e pergunte-se se o mundo está se transformando conforme você gostaria, pergunte-se também se suas ações são justas, diante do presente recebido por Deus para você cuidar.  

Pablo F. Bastos Ribeiro, Estudante de Psicologia da PUC Minas e Moderador da União de Jovens da Segunda Igreja Presbiteriana


publicado no Boletim da Segunda Igreja Presbiteriana de Belo Horizonte em 21/11/10

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Quando o corpo pede um pouco mais de alma

Rev. Sandro Amadeu Cerveira


Dizer que vivemos numa sociedade hedonista que cultua o corpo e a beleza física como o fim supremo já virou lugar comum inclusive na boca daqueles que gastam boa parte de seu tempo e recursos em academias e "Estetic Centers".
Fico sempre intrigado com esses paradoxos. Os mais velhos (como eu) lembrarão que o livro predileto das misses foi durante um bom tempo "O pequeno príncipe". A história, que tem como cenário um deserto, fala de amor, conquistas, escolhas, rituais e até da morte. Pois esse livro-cabeça era frequentemente mencionado por lindas representantes de seus estados e países em meio a um julgamento que de forma alguma pretendia descobrir sua "beleza interior". Talvez a preferência das misses de então pelo livrinho de Saint-Exupéry não fosse apenas jogada de marketing. Quem sabe esse pioneiro da auto-ajuda já não era um grito por um pouco mais de alma?
Hoje a coqueluche (inclusive internacional) é Paulo Coelho que, desconfio, atende de alguma forma a essa demanda por mais alma. Mas e nós cristãos? Ainda acreditamos que, como o apóstolo Paulo, a piedade tem imenso e eterno valor enquanto o exercício físico tem pouca serventia (1 Timóteo 4:8)? Não duvido de que haja consenso entre os cristãos sobre o valor da piedade. O problema é: que sentido atribuímos a essa bela palavra?
Alguns sinais recentes (barulhos e silêncios) vindos do mundo religioso brasileiro parecem indicar que, para nós cristãos, a piedade se resume ao ódio ao mundo. Isso não é novo, mas não deixa de ser impressionante ver líderes e liderados evangélicos e católicos ostentando com orgulho um discurso raivoso e prenhe de ódio contra o que consideram as obras do príncipe deste mundo: o diabo.
Em alguns casos ele, o "Não-sei-que-diga", aparece com voz gutural e gestos grotescos em meio a sessões de exorcismo televisionado como parceiro de cunhadas, amantes, sogras assim como concorrentes e desafetos que se utilizam dos serviços das religiões de matriz africana no esforço de "atrapalhar os caminhos", "matar" e "destruir a vida dela". Após o show o "encosto" é humilhado, xingado, amarrado e, só no ato final, expulso daquele corpo que não lhe pertence.
Em outros o "Cramulhão" aparece de terno ou tailleur na figura de políticos comprometidos com alguma conspiração internacional (atualmente gay, comunista ou muçulmana) cujo objetivo é "acabar com a liberdade religiosa no Brasil e no mundo" implantando o "império da iniquidade". Nestes casos, como é fácil odiar os políticos, alguns chegam a espumar em meio a frases de efeito e bravatas virulentas. Diferentemente do primeiro caso, não raro ao invés de expulsar "o coisa ruim", faz-se alguma aliança com um "arrenegado" de outro partido ou grupo político. Poderia ainda citar os video games do mal , as roupas com símbolos satânicos, os desenhos animados, mas de qualquer modo a marca desta visão de piedade é a mesma: o ódio, a raiva o destempero e a violência verbal contra os "instrumentos" do "Cão".
Com isso não quero dar a entender que tudo são flores e não que se deve fazer escolhas com base em nossa fé e valores; minha ênfase visa chamar a atenção para o perigo de fazer dessas coisas o fim da nossa fé. A sutileza da estratégia maligna é impressionante, pois independentemente do objeto do ódio (inclusive pode ser o próprio "Galhardo") aquele que se deixa tomar pelo ódio e faz dele seu motor já se inclina para o "lado sombrio".
O discurso e a prática de Jesus sempre foram marcados por outro tipo de motivação: o amor.
Isso mesmo: o Senhor sempre apostou nessa "colinha" frágil, enigmática, volátil, mas que sempre sabemos quando ela falta.
Será mesmo necessário repetir? "Amarás o Senhor teu Deus... amarás o teu próximo". Quem não ama não conhece a Deus. É preciso dizer o óbvio? Quem cultiva o ódio em vez do amor se afasta de Deus. Ponto. Não importa o objeto do ódio, importa que fomos tomados por ele. Em um mundo que busca um pouco mais de alma é preciso lembrar que não basta por mais alma no corpo, é necessário por mais amor na alma. Do contrário seremos almas obesas de rancor e ressentimento.
Os cristãos que focaram no amor como virtude central de sua fé frequentemente foram alvo do discurso raivoso inclusive de outros cristãos muito preocupados com a "pureza", com os "bons costumes", com a "nossa cultura" e assim por diante. Vide a maneira como o próprio Jesus foi tratado por seus contemporâneos moralistas, ou como os quakers pacifistas e abolicionistas foram tratados ou ainda os irmãos anabatistas que se recusaram a pegar em armas contra "os infiéis".
 Será que o sopro do Espírito precisará encontrar outros cenáculos mais receptivos do que a igreja que se diz do Senhor?


* O Reverendo Sandro Amadeu Cerveira além de pastor titular da Segunda Igreja é professor universitário, com formação em Teologia pastoral, graduação em História, mestrado em Ciência Política (UFMG) no momento encontra-se na fase final do seu doutorado em Ciência Política também pela UFMG.


quinta-feira, 18 de novembro de 2010

É NECESSÁRIO PREOCUPAR-SE COM A LIBERDADE RELIGIOSA NO GOVERNO DA PRESIDENTA DILMA?

Sandro Amadeu Cerveira


Em seu primeiro pronunciamento como presidenta eleita, Dilma Roussef fez questão de enfatizar que zelará pela liberdade religiosa no país. Fiquei imaginando o que os observadores externos ficaram pensando desse compromisso.  Afinal o Brasil não é uma democracia? A liberdade religiosa nesse país não esta garantida?
 
De fato, apesar de jovem, nossa democracia político-institucional já pode ser considerada consolidada. A discussão sobre transição democrática se desloca cada vez mais para os estudos históricos e o debate na ciência política sobre a consolidação da democracia, tão intenso nos anos 90, cede lugar às pesquisas sobre as questões da qualidade de nossa democracia. Salvo para os ainda acometidos da síndrome de colono nossas instituições democráticas têm se mostrado de forma geral  robustas e eficazes no enfrentamento dos desafios próprios de uma sociedade moderna.
 
No que se refere à relação igrejas–estado o Brasil pode ser considerado dos mais avançados, com um regime de separação de Estado e Igreja sem dispositivos jurídicos e políticos particulares à Igreja Católica. A concordata Brasil-Vaticano referendada recentemente pelo Congresso brasileiro pode ser considerada um retrocesso em relação a essa tradição isonômica, mas é preciso lembrar que a aprovação só aconteceu após acordo com a bancada evangélica em troca da extensão das prerrogativas as demais confissões. Comparado com a maioria dos países latinoamericanos é correto ainda dizer que o arranjo brasileiro contribui para a igualdade de direitos entre as diferentes confissões religiosas reduzindo as possibilidades de discriminação religiosa estatal.
 
As igrejas também não podem se queixar do tratamento recebido durante o governo Lula. Apesar do terror disseminado nas eleições anteriores, igrejas não foram fechadas, não foi instituída nenhuma religião civil satanista, padres não foram obrigados a casar divorciados e os religiosos professos não foram discriminados no governo; pelo contrário , os evangélicos, por exemplo, nunca participaram tão ativamente em um governo federal. Marina Silva é agora talvez o nome mais famoso, mas é preciso não se esquecer do papel e destaque de Benedita da Silva, Marcelo Crivela, Magno Malta, Gilmar Machado, Walter Pinheiro entre outros nomes respeitados por sua fé e trajetória política.
 
De onde vem então a necessidade de desfazer esse medo da perda da liberdade religiosa? Pura fantasia? Delírios persecutórios? Creio que não.
 
Desconfio que os líderes religiosos saibam muito bem que nos últimos anos não houve nenhuma ameaça real a liberdade religiosa no sentido de perseguição ou discriminação religiosa por parte do Estado. Acredito que a questão é outra, ou melhor, são outras.
 
A chave talvez esteja no uso nos diferentes sentidos que o termo "liberdade religiosa" pode assumir em distintos contextos. Sob este termo abriga-se uma série de questões relativas a interesses e valores caros ao campo religioso que (como mostrou o final do primeiro turno destas eleições) não podem ser ignorados impunemente. Partindo-se do pressuposto que interessa às instituições religiosas sua manutenção e crescimento aponto dois aspectos que considero cruciais.
 
O primeiro tem a ver com a preocupação com as facilidades e obstáculos que o poder público possa colocar ao exercício da religião e a busca por novos adeptos. Podemos dizer que há aqui uma dimensão passiva do conceito de liberdade. Em outras palavras liberdade religiosa rima com liberdade de e no mercado religioso. No Brasil, devido a uma série de fatores, as igrejas competem pelos fiéis em uma espécie de mercado religioso aberto. Não uso o termo mercado no sentido comercial ou pejorativo. O que quero enfatizar é que ao contrário de outros países onde uma ou poucas igrejas monopolizam com respaldo político e jurídico o campo religioso , no Brasil temos um cenário de verdadeira competição religiosa pluralista.
 
Os líderes religiosos sabem o quanto essa liberdade lhes é favorável  , assim como sabem que é na esfera política que esse arranjo pode ser mudado ou preservado, diminuído ou ampliado. Os debates no Congresso sobre o novo código civil e a lei de criminalização da homofobia que uniram católicos e evangélicos , e sobre a concordata com o Vaticano, que os dividiu , são exemplos da importância da política para a manutenção da "liberdade religiosa".  Neste aspecto a defesa e a proposição de leis "laicistas" que contribuam com a isonomia em relação aos católicos (caso do debate em torno da concordata com o Vaticano) parecem incrementar a liberdade religiosa; por outro lado quando uma lei igualmente laica afirma direitos de outras minorias que possam de alguma forma, gerar empecilhos a pregação religiosa (caso da PL 122) isso é percebido como limitação da liberdade religiosa.
 
O segundo ponto associado ao primeiro, embora distinto, têm a ver com o desejo e a expectativa dos grupos religiosos de influírem na sociedade na qual estão inseridos , em particular no que se refere a temas morais. Nesse sentido o alinhamento é distinto. Católicos, evangélicos e espíritas parecem convergir em temas morais polêmicos tais como aborto, união civil de pessoas do mesmo sexo, eutanásia, experiências com células tronco entre outros. Neste caso  , liberdade religiosa significa liberdade para influir no processo legislativo evitando-se ou criando leis coerentes com seus valores.
 
Se os valores religiosos vão prevalecer na produção de leis relativas à família, vida, corpo ou se posturas mais laicas serão vitoriosas não caberá a presidenta decidir sozinha. Cabe à sociedade discutir estes temas e em última instância ao poder legislativo deliberar. O debate é urgente e o caso da descriminalização do aborto é sintomático. Durante a campanha presidencial houve um falso debate, ou melhor, nenhum debate e poucos ficaram sabendo, por exemplo, que são raras as igrejas evangélicas que subscrevem ipis literis a posição católica sobre o tema.
 
Se as palavras da presidenta eleita significam que o Brasil manterá o atual arranjo político jurídico que está na base do pluralismo religioso (e nunca houve qualquer razão para se imaginar algo distinto) então os religiosos estão seguros e devem mesmo comemorar. Na verdade todos aqueles que independentemente de sua crença ou falta dela acreditam que a liberdade de fé e consciência é um direito democrático fundamental devem estar felizes com o compromisso reiterado. Caberá a cada grupo religioso aproveitar as oportunidades para divulgar suas crenças e valores  , lembrando sempre que se esse direito não for garantido aos demais grupos ele também não lhes servirá de nada.
 
De forma similar , se as palavras de Dilma reconhecem e visam respeitar a liberdade de participação política dos que defendem posições coerentes com seus valores religiosos na arena política então também não há motivo de preocupação. Isto é inerente ao sistema democrático. Há sim que se preocupar com a qualificação do diálogo e as estratégias de embate. Nem Deus, nem o "Estado Laico" são argumentos em si mesmos e é preciso discutir caso a caso sem desqualificações a priori. Será preciso que os defensores de valores religiosos e laicos também entrem na disputa aceitando que o resultado final é mesmo incerto. Nas palavras de Adam Przeworski "Ama a incerteza e serás democrático". 
  
 


* O Reverendo Sandro Amadeu Cerveira foi pastor titular da Segunda Igreja, atualmente pastor colaborador, é professor universitário, com formação em Teologia pastoral, graduação em História, mestrado em Ciência Política (UFMG) no momento encontra-se na fase final do seu doutorado em Ciência Política também pela UFMG.


segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Leis definindo o início da vida são úteis?

Dois estados norte-americanos definiram, legalmente, o início da vida ocorrendo na concepção e o aborto como o fim de uma vida humana. Pelo menos outro estado tem proposta legislativa tornando pessoa o não-nascido a partir da concepção.

Diversas opiniões foram emitidas a respeito do assunto:

- este tipo de proposta legislativa realmente auxilia o não-nascido, ganhando ou perdendo, pois traz ao público a discussão a respeito do início da vida, do caráter da criança no útero materno. Por exemplo, se ela é um ser humano tem o mesmo direito dos demais, incluindo o principal de todos, viver? (Kristi Burton Brown)

- obviamente que legislação tornando público o fato de que uma nova vida humana se inicia na concepção auxilia o não-nascido. Não importa o quão vulnerável possa ser, é um ser humano. Nascemos na vulnerabilidade, na dependência do outro e, obviamente, morreremos da mesma forma. Do zigoto ao coma irreversível permanecemos igualmente humanos. (Gilbert Meilaender*)

- há sólida base científica para chamar os não-nascidos de seres humanos. O debate que permanece é se é eticamente desejável proteger ou não seres humanos por faltarem certas características. E o debate não poderá ser honesto se não formos claros que não é sobre humanos X não-humanos, mas sobre humanos com características distintas. (John Kilner)

- esta é a batalha final sobre o que é e o que não é uma pessoa. Se pudermos dizer que alguém não é uma pessoa, podemos fazer o que desejarmos com ela: no início ou no fim da vida. O debate atinge os comatosos e os doentes com Alzheimer: são eles pessoas? Se não são, podemos ajudá-los a morrer. O aspecto mais básico desta discussão é o que é uma pessoa, e os cristãos deixaram os não-cristãos conduzirem o debate por muito tempo. (David Stevens, president, Christian Medical Association)

- na discussão sobre o aborto, este tipo de atitude não ajuda, pois não mira o ponto central da questão, o relacionamento. Quando um aborto acontece, a mãe diz "eu não posso ser sua mãe"; "não posso, não serei, não desejo ter um relacionamento com você". Leis não falam deste aspecto. (Bob Smietana)

- discussões úteis relacionadas aos embriões humanos, como aborto e rastreamento genético, são prejudicadas por um tipo de "visão de túnel". À direita, pessoas focam exclusivamente a personalidade do embrião, e à esquerda, exclusivamente o direito de escolha. Definir personalidade não faz a discussão avançar, apenas codifica uma situação familiar. O que está faltando na discussão da ética reprodutiva é consideração com compaixão de histórias reais de gravidezes não planejadas e de histórias familiares de doenças genéticas. Ir além da repetição de velhos argumentos levando em consideração a complexidade da situação levará o debate aonde lei nenhuma conseguirá. (Ellen Painter Dollar)

* autor de "Bioética: uma perspectiva cristã" e "Bioética: um guia para cristãos"

tradução livre, e adaptada, por Eduardo Ribeiro Mundim do artigo original
"When Life Begins: Do laws defining personhood help the unborn?" - publicação original http://www.christianitytoday.com/ct/2010/november/2.12.html

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Um Domingo Espetaculoso - ou Cenas de um novo Bestiário: Réplica

Eduardo Ribeiro Mundim

A última postagem, que aborda reportagem da Rede Record sobre o infanticídio indígena, mereceu um comentário sucinto, que direciona ao endereço http://direitopublicoediversidade.blogspot.com/2010/11/um-domingo-espetaculoso-ou-cenas-de-um.html. Faço as minhas considerações sobre o que está exposto naquele atalho.

1. as imagens mostradas não são supostas reconstituições de supostos homicídios. Não há razão racional para duvidar da reconstituição - pode-se duvidar do homicídio. Estas imagens são tiradas do filme "Hakani" (que pode ser acessado em www.hakani.org, incluindo bastidores da filmagem) e são, até prova em contrário, reconstituição fiel de uma prática cultural que atenta contra a continuidade física (e portanto cultural) de povos indígenas distintos.

2. o termo infanticídio não é correto, dentro da terminologia do direito. Mas, como outras palavras, perpetua-se para descrever uma determinada situação particular.

3. somente o telespectador irresponsável concluirá, com base na reportagem (disponível em http://noticias.r7.com/videos/exclusivo-aldeias-indigenas-sacrificam-criancas/idmedia/081f526d82f8899a4d5f5438920fd581.html - disponível na íntegra, 21 min) de que os índios são demônios assassinos. Concluir que a maioria da população brasileira tomará esta atitude é depreciá-la; é negar a capacidade de se formar opiniões através da discussão ampla e democrática, com participação ativa da elite intelectual (aqui entendida por todos os brasileiros com formação universitária). Como pode ser comprovado pelo vídeo, há uma preocupação de todos os envolvidos em não transmitir este preconceito. Convido os leitores a pontuar estes momentos (se existirem) e confrontá-los com o "texto" completo.

4. concordo com a avaliação da situação dos povos indígenas, e com todo o mal que causamos a eles quando invadimos o território por nós batizado de Brasil há 500 anos atrás. Discordo que a reportagem os vulnerabilize mais - entendo que ela os humaniza à medida que mostra como povos que nos são desconhecidos compartilham conosco de angústias existenciais importantes - para as quais deve ser buscada uma saída.

5. Marcia Suzuki é evangélica, obreira da JOCUM. Etnolinguista, com mestrado; uma das poucas brasileiras que domina idiomas indígenas para os quais, até há algum tempo, a FUNAI não tinha em seus quadros. Dizer que sua única atividade junto aos indígenas é a evangelização constitui preconceito. Sugiro que sejam apresentadas evidências do fato.

6. os termos da publicação são preconceituosos, na minha opinião, a respeito da JOCUM e da ATNI.

7. não vejo manipulação das falas indígenas. No contexto de toda a reportagem, busca-se evidenciar a difícil situação que uma prática ainda existente coloca as comunidades indígenas.

8. o "infanticídio" permanece como prática, existindo, além de testemunhas, dados estatísticos esparsos. Dizer que não existe de forma nenhuma é irreal; dizer que é uma prática generalizada, idem.

9. o projeto de lei, conhecido como Lei Muwaji, não criminaliza o indígena na forma apresentada pelo Deputado Henrique Afonso. A proposta está disponível na rede em http://www.camara.gov.br/sileg/MostrarIntegra.asp?CodTeor=459157.  Torna crime o todo aquele que tomar conhecimento de situações de risco (e por razões de coerência exclui os indígenas) e não tomar as medidas de proteção para a criança, e explicita os órgãos públicos responsáveis, nas suas áreas de atuação, para o fato. Mira os não-índios que prezam o costume cultural sobre a vida resgatável.

10. sobre a habitual omissão da FUNAI, cabe a ela se manifestar, o que inclui ação judicial contra a Rede Record por falsidade, se for o caso.

11.  lamento o preconceito, que o autor (a) deixa transparecer em todo o texto. A tentativa de isenção neste aspecto foi infrutífera frente a todo o comentário

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Reportagem sobre infanticídio na Rede Record

Na noite do dia 07 de novembro, a Rede Record de televisão, no Programa Domingo Espetacular, apresentou uma reportagem corajosa sobre o infanticídio indígena (disponível em  http://noticias.r7.com/videos/exclusivo-aldeias-indigenas-sacrificam-criancas/idmedia/081f526d82f8899a4d5f5438920fd581.html). O texto foi relativamente equilibrado, as imagens impactantes. Não deixou de ser uma reportagem, com despreocupação com as palavras: o termo "sacrifício" foi repetido e, pessoalmente, o considero inadequado.

Houve preocupação em demonstrar que os indígenas, ao praticarem infanticídio, não são monstros, ou cruéis. Mas que sofrem profundamente com as mortes, que, muitas vezes, não sabem ser evitável com sucesso.

Esperamos que o debate seja retomado, inclusive fazendo andar a "lei muwaji".

Atitude habitual, a FUNAI não atendeu aos repórteres.

Maiores informações:
www.hakani.org
Não existe morte sem dor

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Postado por Blogger no Lei Muwaji em 11/08/2010 04:49:00 AM

domingo, 7 de novembro de 2010

O Diabo, o cristão e a internete

Eduardo Ribeiro Mundim

Há um antigo ditado: "quem conta um conto, acrescenta um ponto". Lembro-me que a primeira vez que o ouvi foi durante uma aula de língua portuguesa, no colégio. E ele foi apresentado com uma dinâmica que demonstrou quão facilmente ele se torna verdadeiro.

Nos dias atuais, a internete exponenciou o fenômeno: o que é publicado em um sítio, ou diário virtual ("blog"), facilmente é copiado e passado adiante. Ou, mensagens eletrônicas, às vezes sem pé nem cabeça, são repassadas com o título "só repassando".

Até que ponto tal comportamento é condizente com a postura madura?

A sociedade contemporânea parece que perdeu o medo das palavras. E o suposto anonimato providenciado pela rede mundial de computadores parece reforçar o conceito de que se pode dizer o que quiser, sem medo.

Não foi isto que vimos nas últimas eleições? Quanta mentira, ou falsas verdades, ou meias-verdades foram transmitidas e retransmitidas sem constrangimento e remorso? Quantos vídeos foram compartilhados sem que sua autenticidade fosse comprovada?

Há dois comportamentos preocupantes: o dos alarmistas, sempre prontos a denunciar ou alertar sobre uma maracutaia ou ameaça prestes a concretizar, e o dos fofoqueiros, aqueles que, sem analisar, repercutem as mesmas denúncias e alertas.

Há mais de vinte anos ouvi um pregador emitir um juízo sobre este tipo de denúncia: serviço ao diabo, pelo qual ele, humildemente, agradece.

É diabólico quando o fato (o crime ou a ameaça) não é corretamente descrito, verdadeiramente relatado e apresentado com análise de mais de um ponto de vista. É diabólico quando o fato se torna um fim em si mesmo - passa a ser debatido à exaustão, conferindo aos participantes a certeza de terem lutado por um mundo melhor... E Satanás observa, e ri com seus botões, satisfeito por manipular os filhos de Eva com tanta facilidade! Ele não deseja que a verdade apareça (pois é o pai da mentira), que os mecanismos que deram à luz o fato sejam elucidados, enfrentados, modificados (pois então o fato não mais se repete). A ele, inimigo de nossas vidas e de nosso mundo, interessa a confusão, a paralisia da ação corretiva, o emburrecimento do senso crítico.

Imagino os espasmos de prazer que ele tem (será possível ?!) ao manipular cristãos de qualquer denominação neste serviço. Se você tem o hábito de ir a internete, já deve ter presenciado algum fato como o que aqui descrevo.

Como evangélico me envergonho de encontrar ausência do espírito bereano (os cristãos de Bereia não aceitaram nada baseado na autoridade de alguém, mas exclusivamente pela pesquisa nas Escrituras) entre nós. Envergonho-me ao ver líderes se digladiando publicamente, sem preocupação com o outro, com palavreado e/ou tom de voz que imaginava pertencer ao submundo. Envergonho-em de, às vezes, cair na mesma armadilha.

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Aliança Cristã Evangélica Brasileira - carta de princípios

A Unidade na fé a caminho da missão
Nossa Visão
Manifestar a unidade da igreja através do testemunho visível de amor e serviço no evangelho de Jesus Cristo
Nossa Missão
A Aliança Cristã Evangélica Brasileira é uma parceria de igrejas e organizações e tem como missão congregar seguidores do Senhor e Salvador Jesus Cristo como expressão da unidade da igreja.

Sob o nome de Aliança lembramos que na história da redenção Deus é Deus de aliança. No Antigo Testamento, ele chama várias tribos para entrar em aliança com ele e constituir um povo. No Novo Testamento, pelo sacrifício do seu Filho, ele estabelece uma nova aliança, por meio da qual chama homens e mulheres de diferentes nações e raças para constituir o seu povo – único, que serve a um só Deus e tem um só Senhor, Jesus Cristo. E isso é estabelecido pela dádiva do Espírito Santo, que nos une no vínculo da paz. Em aliança manifestamos nosso desejo de que se cumpra em nossas vidas a oração de Jesus: “para que todos sejam um, Pai, como tu estás em mim e eu em ti, que eles também estejam em nós, para que o mundo creia que tu me enviaste” (João 17.22).

A Aliança Cristã Evangélica Brasileira identifica-se como seguidora de Jesus Cristo, razão pela qual participa do esforço pela unidade da igreja. A serviço dessa mesma igreja ela se sabe, também, a serviço da missão de Deus no mundo, o que se dá sob a direção da Palavra de Deus e a inspiração do Espírito Santo.

A Aliança confessa a sua fé em sintonia com o legado evangélico que tem marcado significativos setores da igreja cristã, e se sabe alicerçada nos marcos da Reforma Protestante, destaque especial para os seus postulados básicos: Sola Scriptura, Sola Christus, Sola Gratia, Sola Fide, Soli Deo Gloria.

Ela afirma seu compromisso a partir da realidade brasileira, onde quer viver em obediência a Deus e a serviço da sua igreja.

Ela congrega denominações, igrejas, redes, associações, organizações, ministérios e movimentos que se identificam e compactuam com suas crenças, valores e princípios como descritos abaixo.
Nossas Crenças
Afirmamos a nossa fé com toda a igreja de Jesus Cristo, conforme as palavras do Credo Apostólico:
Creio em Deus Pai, todo-poderoso, Criador do céu e da terra.
E em Jesus Cristo, seu Filho unigênito, nosso Senhor, o qual foi concebido pelo Espírito Santo, nasceu da virgem Maria, padeceu sob o poder de Pôncio Pilatos, foi crucificado, morto e sepultado, desceu ao inferno, no terceiro dia ressuscitou dos mortos, subiu ao céu, e está sentado à direita de Deus Pai, todo-poderoso, de onde virá para julgar os vivos e os mortos.
Creio no Espírito Santo, na santa Igreja Cristã, a comunhão dos santos, na remissão dos pecados, na ressurreição do corpo e na vida eterna. Amém.
Afirmamos a nossa fé bíblica com a comunidade evangélica histórica e global, para o que destacamos as seguintes marcas:
  1. Como seguidores de Jesus Cristo confessamos nossa fé no Deus vivo, revelado através das Escrituras como o Deus trino: Pai, Filho e Espírito Santo. Adoramos e servimos a Deus Pai, como criador e sustentador de céus e terra; a Jesus Cristo, como Senhor e Salvador, que busca a reconciliação de todo o universo com ele mesmo; e ao Espírito Santo como o consolador, intercessor e mantenedor da nossa fé, que nos capacita para servir a Deus no mundo.
  2. A Bíblia como palavra de Deus, diretriz da nossa fé e disciplina das nossas práticas, que registra a revelação divina para a redenção da totalidade da criação.
  3. Todos os seres humanos são formados à imagem de Deus para amá-lo e adorá-lo e servi-lo. Em decorrência da queda humana, causada pela rebelião contra o Criador, porém, a realidade do mal e do pecado nos separa de Deus e se instala, com todas as suas funestas consequências, em todas as áreas do relacionamento humano bem como em todo o mundo criado por Deus.
  4. Jesus de Nazaré, o Cristo, é o único mediador entre Deus e os homens e mulheres. Sua encarnação é o nosso modelo de vida e missão. O seu sacrifício na cruz é a expiação dos nossos pecados e a expressão da sua graça redentora. A sua ressurreição é o anúncio de vida nova e a esperança de novos céus e nova terra.
  5. A igreja como um sinal visível do Reino de Deus é formada pelos que acolheram o evangelho e assim constituíram o corpo comunitário de Cristo, o qual, sob a marca da Palavra e do Espírito, está comprometido com a vivência testemunhal ativa da unidade e missão de Deus no mundo.
  6. O anúncio da missão redentora e restauradora de Deus no mundo, com o qual nos comprometemos, se concretiza através do compromisso de vida, da palavra anunciada, da voz profética, da ação de fé realizada e do sinal milagroso de Deus entre nós. Missão que é confiada por Deus à igreja e que se realiza a cada geração e em todos os lugares deste mundo criado por Deus, sempre no poder do Espírito Santo.
  7. A esperança na volta de Cristo, quando ressuscitará os mortos e trará salvação eterna e julgamento final, estabelecendo novos céus e nova terra, onde habita a justiça, conforme a promessa da sua própria Palavra.
Nossos Valores

Buscamos viver a nossa fé segundo os valores encontrados nas Escrituras e que a fé cristã tem afirmado e vivido no decorrer da história. Estes valores anseiam ser uma expressão dos valores do Reino de Deus, na unidade do Espírito, e assim devem ser vividos.

  • A fé, a esperança e o amor, sendo que o maior deles é o amor, como diz o apóstolo Paulo. Buscamos o amor que se inspira no amor de Deus, a esperança que se nutre da promessa de vida que nos é dada por Jesus e a vivência de uma fé, que é sempre dom de Deus.

  • A verdade que liberta. Cremos na verdade que Jesus nos trouxe na sua vida e através dela e que produz profunda liberdade e libertação de todos os mecanismos de opressão, violentação, mentira e morte.

  • A construção da comunidade. A fé cristã tem uma vocação comunitária e sempre se expressa em igreja – a comunidade de fé. A igreja é comunidade missionária e, como tal, é comunidade que acolhe e busca o outro, especialmente o marginalizado - a criança, o pobre e o oprimido.

  • A prática da oração em sinal de dependência de Deus. Convidados e desafiados pelo Evangelho, praticamos a oração uns pelos outros, bem como a intercessão por todos, especialmente pelas autoridades dos lugares onde exercemos ministério.

  • A afirmação da vida. Afirmamos a vida como sendo uma preciosa e amorosa criação de Deus. Ela deve ser valorizada, preservada e nutrida em todos os seus momentos, tempos, expressões e lugares.

  • O compromisso com a criação. Afirmamos a criação como uma dádiva de Deus para nela o ser humano construir a vida em comunidade, com responsabilidade ambiental e em adoração ao próprio Deus.

  • A prática do perdão. Inspirados na realidade do perdão de Deus, buscamos praticá-lo no decorrer da vida.

  • A valorização da diversidade assim como da igualdade. Deus nos criou (homens e mulheres) iguais na nossa humanidade e diversos na expressão desta. Somos fruto da sabedoria e do amor criativos de Deus e rejeitamos práticas e expressões de preconceito, discriminação e intolerância.

  • A busca da paz com justiça. Cremos na realidade, possibilidade e necessidade da paz em todos os níveis da vida humana, na consciência de que tal paz só ocorre acompanhada da justiça. Paz e justiça são irmãs gêmeas.

  • O compromisso com uma ética individual e coletiva. A fé e a vida formam uma unidade indivisível: uma não pode existir sem a outra. A fé em Cristo precisa seguir a Cristo na construção de uma vida individual e coletiva marcada pelo compromisso com uma ética de amor, justiça, verdade e integridade.

Nossos Princípios

Cremos que o seguimento a Jesus Cristo, a vivência da fé na comunidade dos crentes e o serviço a Deus no contexto brasileiro e a partir dele nos convidam e convocam a pautar a nossa vivência de acordo com os princípios que enumeramos a seguir. Comprometidos com estes princípios nos percebemos, não como aqueles que já os alcançaram, mas como aqueles que estão a caminho.

  • Amamos porque Deus nos amou primeiro. Na consciência do amor de Deus, que nos acolhe e recebe, pautamos a nossa ação inspirados nesse amor.

  • A verdade é vivida em amor. Reconhecendo a Jesus como a verdade, cremos que o seu amor deve pautar a busca e a afirmação da verdade.

  • Buscamos a construção da confiança e da unidade. A fé em Cristo produz confiança em Deus e no próximo e essa confiança é vivida e testada na comunidade de fé que busca a unidade.

  • Cidadania e serviço – a nossa fé, inspirada no modelo de Jesus, nos ensina a priorizar o bem do outro, servi-lo com amor e zelar pelo exercício de uma cidadania marcada pela justiça, o amor e a verdade.

  • Horizontalidade nos processos decisórios. A fé cristã valoriza a comunidade e afirma o princípio do serviço e da igualdade humana.

  • Transparência que gera credibilidade. Cremos que a verdade do Evangelho produz confiança e esta gera transparência marcada pela verdade, pela confissão e pelo perdão.

  • Liberdade com responsabilidade. Advogamos um estado laico, no qual se observa a liberdade religiosa e o direito ao culto. Liberdade essa que afirma a construção de toda a sociedade e nega direitos a grupos e setores particulares com exclusão de outros.

Nossos Objetivos

A Aliança Cristã Evangélica Brasileira tem por finalidade:
  1. Testemunhar a unidade do Corpo de Cristo, mediante o estabelecimento e desenvolvimento de relações fraternais entre os cristãos evangélicos brasileiros e organizações afins, identificados com os objetivos da Aliança Evangélica, sua Carta de Princípios e Diretrizes.
  2. Testemunhar a unidade do Corpo de Cristo, como Aliança, junto a outras expressões cristãs presentes em nosso contexto e áreas de ministério.
  3. Servir de espaço de relacionamento para troca de experiências entre cristãos evangélicos, participantes de igrejas, organizações de serviços, redes ministeriais e entidades afins.
  4. Exercer um papel de informação e comunicação entre os participantes da Aliança e entre estes e a sociedade brasileira.
  5. Potencializar ações e facilitar parcerias em áreas da vida da igreja, tais como evangelização e ação social, ação pastoral, reflexão teológica, diaconia, direitos humanos, capelanias, ações missionárias e de intercessão, dentre várias outras iniciativas e atuações relevantes à igreja de Cristo, sempre respeitando a diversidade denominacional e a autonomia de seus membros.
  6. Posicionar-se sobre questões relevantes para os filiados da Aliança e manifestar-se oportunamente sobre seus posicionamentos mediante anuência do Conselho Geral.

Nossa Filiação

  • Podem ser filiados à Aliança, com direito a voz e voto, organizações evangélicas, tais como igrejas, denominações, agências, organizações e movimentos, que subscrevam a sua Carta de Princípios e Diretrizes.

  • Podem ser recebidos como filiados da Aliança, com direito a voz, pessoas físicas que subscrevam a sua Carta de Princípios e Diretrizes, desejosos de contribuir e participar da vida da Aliança.

Este item ainda necessita maior maturação. Queremos ter as portas abertas para a filiação de pessoas mas insistimos que “voz e voto” devem ser uma prerrogativa das instituições filiadas à Aliança, às quais as pessoas seriam, em princípio, filiadas e portanto nelas representadas.


Nosso Funcionamento

  1. A Aliança realizará o Fórum de Filiados a cada três anos pelo menos ou sempre que o Conselho Geral o convocar.
  2. O Fórum de Filiados da Aliança escolherá um Conselho Geral, que se reunirá anualmente, composto por 15 membros, que deliberará sobre os interesses da Aliança no período entre a realização dos referidos fóruns.
  3. Assim que for constituído e sempre que for reformulado, o Conselho Geral escolherá um Grupo Coordenador, composto de 5 membros dentre os seus integrantes.
  4. O Grupo Coordenador escolherá dentre seus pares um Coordenador e dois Vice-Coordenadores.
  5. O Grupo Coordenador contratará um Coordenador Executivo.
  6. O Conselho Geral será renovado a cada três anos em, pelo menos, um terço dos seus membros.
  7. Os membros do Conselho Geral que vierem a concorrer a eleição político-partidária serão automaticamente desligados do Conselho.
  8. Os membros do Conselho Geral têm livre acesso a todas as reuniões, foros e organismos da Aliança.
  9. Em cada Encontro de Filiados a Aliança nomeará de 3 a 5 embaixadores que se identifiquem inteiramente com os propósitos da Aliança e trabalharão no sentido de propagá-los. A nomeação terá duração de 3 (três) anos, podendo ser renovada.
  10. Compete ao Conselho Geral indicar Grupos de Trabalho que serão constituídos conforme os objetivos da Aliança.

Compete ao Conselho Geral

  1. Convocar o Fórum de Filiados da Aliança, por meio do Grupo Coordenador.
  2. Conduzir o processo de aceitação de novos filiados.
  3. Conduzir o processo de desligamento de determinado filiado.
  4. Comunicar aos filiados da Aliança sobre suas decisões e estimular a participação destes.
  5. Escolher o Grupo Coordenador da Aliança, constituído de 5 membros, dentre os integrantes do Conselho Geral.
  6. Nomear os Embaixadores da Aliança.
  7. Nomear representantes regionais ou estaduais da Aliança.
  8. Apresentar relatórios financeiros e de atividades.
  9. Conduzir o processo que resultará na formação dos grupos de trabalho.

Compete ao Grupo Coordenador

  1. Operacionalizar as deliberações do Conselho Geral.
  2. Representar a Aliança em todos os foros que se fizerem necessários, podendo para isso convidar outro membro do Conselho Geral ou designar o Coordenador Executivo para que o faça.
  3. Contratar o Coordenador Executivo, bem como acompanhar e supervisionar o seu trabalho.
  4. Elaborar, junto com o Coordenador Executivo, o Plano de Trabalho Anual.
  5. Responsabilizar-se pelas comunicações e manifestação de declarações da Aliança por meio de toda e qualquer mídia (interna e externa).

Compete ao Coordenador Executivo

  1. Responder e gerenciar a tesouraria e contabilidade.
  2. Implementar o plano de trabalho anual do Conselho Geral.
  3. Junto com o Conselho Geral formular, coordenar e acompanhar os grupos de trabalho responsáveis pela execução do plano anual de atividades.
  4. Manter uma rede de coordenadores regionais ou estaduais.
  5. Representar a Aliança em reuniões e eventos do interesse desta.

Das Receitas e Despesas

A receita da Aliança será constituída pela taxa anual, estabelecida pelo Conselho Geral, de seus Filiados e por doações voluntárias, desde que tais recursos não tenham sua origem em atividades ilegais, ou em qualquer tipo de jogo.

Toda a receita será aplicada única e exclusivamente na consecução das finalidades e objetivos da Aliança.

Da Alteração da Carta de Diretrizes

A Carta de Diretrizes da Aliança poderá ser alterada no Fórum de Filiados mediante a aprovação de maioria simples.

terça-feira, 2 de novembro de 2010

Uma parábola cristã: uma segunda visão

Eduardo Ribeiro Mundim

Hélio Schwartsman escreveu um provocante artigo, disponível na internete1, com o título “Uma parábola cristã”. Não é um texto fácil para o crente – desperta, de imediato, reações de defesa instintivas. Mas não é um texto leviano. Suas ponderações não são um desfilar de argumentos pueris. Merecem ser analisadas e, se for o caso, aceitas humildemente. É o que pretendo fazer nas próximas linhas.
A interpretação da Bíblia: “O que eu quis dizer e reafirmo é que códigos religiosos em geral e a Bíblia em particular estão repletos de passagens que, dependendo de como são lidas, justificam as piores violências”. Não há como negar a verdade da observação. A questão de como interpretar as Escrituras Sagradas não tem uma resposta única da comunidade cristã; a começar dos seus três grandes grupos: católico romano, católico ortodoxo e igrejas pós-reforma. E uma das razões de existirem tantas ramificações é a não uniformidade das regras de interpretação, os diferentes pontos de partida e as respostas discordantes a diversas questões. E o Velho Testamento é um farto arsenal de problemas. artigo completo