sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Debate sobre camisinha é barulho por nada

LUIZ FELIPE PONDÉ
COLUNISTA DA FOLHA
Sempre me espanta o fato que se dá tanta atenção ao que o papa diz. Não porque ele não seja uma figura importante (no caso de Bento 16, também um teólogo importante), mas porque muita gente que faz barulho com o que fala não se diz católica.
Afinal, por que tanta atenção? Talvez haja aí algo que a psicanálise possa responder: trauma com o pai? Ser contra a "camisinha" inviabiliza sua distribuição no mundo? Custo a crer que a fala da igreja diminua em uma dezena sequer o número de camisinhas acessíveis. Acho muito barulho por nada.
A Igreja Católica é uma instituição antiga e sábia. Gente mal informada pensa o contrário. Esteve em muitas trincheiras ao longo de 2.000 anos, salvou gente, matou gente. Espírito e corpo, como todos nós. Teve e tem um papel civilizador essencial.
Acho um erro quem considera possível descartar a posição da igreja para com "hábitos sexuais contemporâneos" de forma ligeira como se fora simples "atraso".
Frases como "o mundo avançou muito" são normalmente indício de superficialidade analítica. Homens e mulheres continuam atolados nos mesmos dramas de amor, ódio, sexo e morte.
O foco da igreja deve ser a humanização da sexualidade, o que significa basicamente que se sexo é barato e amor é caro, o primeiro sem o segundo sempre corre o risco de ser degradante.
Neste sentido, o uso da camisinha é apenas paliativo no combate a comportamentos sexuais promíscuos que aprofundam a contaminação com doenças sexualmente transmissíveis (DST).
A melhor forma (todo mundo sabe) de combater DST é a mudança de comportamento sexual (tornar o sexo "mais caro" ao afeto).
Mas isso ninguém quer pensar porque é "feio" dizer que a "vida como balada" é um beco sem saída. Mas é exatamente aí que a igreja destoa e por isso se torna essencial, para além das crenças de cada um.
O pecado da Igreja Católica nesses assuntos é "elevar" demais o nível do debate, saindo do senso comum que é simplesmente achar que sexo se resolve "lavando o corpo com água".
A igreja condena o pecado, mas não o pecador. Aceitar o uso de camisinhas em casos de prostituição pode ser apenas uma forma de "misericórdia" pelo coitado sexual que "vende" seu corpo como escravo.
publicado Folha de São Paulo no dia 25/11/10 - disponível para assinantes em http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft2511201006.htm

Um comentário:

  1. Tenho a impressão de que os católicos que efetivamente lutam pela humanização da sexualidade não estão no Vaticano, mas no "front" das muitas pastorais ligadas a sexualidade que muito antes da "misericordiosa" fala do antigo inquisidor souberam priorizar o espirito da lei em detrimento de sua letra morta.

    Ja que o intelectual famoso não o fez dou eu os parabés aos homens e mulheres anonimos que leais a sua fé souberam chegar aos prostibulos, as ruas, as baladas e aos jovens com uma mensagem ética mas não irresponsável.

    Outra coisa. Desconfio seriamente tambem da afirmação categórica e não fundamentada do articulista de que a posição da ICAR nao afeta politicas públicas em especial a distribuição de camisinhas. Ou o Papa é João Batista ou é um tolo de ficar pregando no deserto.
    Alguem mais duvida da influencia da ICAR junto aos Estados com grande contingente de população católica?

    O professor Pondé teria lido as orientações do vaticano para os politicos e legisladores católicos sobre sua responsabilidade de defender as posições desta religião na elaboração de leis civis.

    Bom é isso...

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