domingo, 1 de março de 2009

Diário de Wesley, Fevereiro de 1736

Domingo, 1º de fevereiro. Falamos com um navio da Carolina, e quarta-feira, 4, chegamos a uma área rasa. Por volta do meio-dia, as árvores eram visíveis do mastro, e, à tarde, do convés principal. Na Lição da Noite as palavras eram estas, “Uma grande porta, e eficaz, é aberta.” Ó, que ninguém possa fechá-la!

Quinta-feira, 5. Entre duas e três da tarde, Deus nos trouxe sãos e salvos ao rio Savannah. Jogamos âncora perto da Ilha Tybee, onde os bosques de pinheiros que margeavam a costa compunham uma encantadora paisagem, exibindo, por assim dizer, a exuberância da primavera no vigor do inverno.

Sexta-feira, 6. Por volta das oito da manhã, pisamos pela primeira vez em solo americano. Era uma pequena ilha desabitada, próxima a Tybee. O Sr. Oglethorpe nos levou a uma colina, onde todos ajoelhamos para agradecer. Depois ele embarcou para Savannah. Quando as demais pessoas vieram para a terra firme, reunimos nosso pequeno rebanho para orar. Várias partes da Segunda Lição (Marcos 6) foram maravilhosamente adequadas à ocasião; em particular, o relato da coragem e sofrimentos de João Batista, as instruções de nosso Senhor aos primeiros pregadores do seu Evangelho, seu trabalho árduo e livramento no mar, com estas palavras confortadoras, “Sou eu, não temais.”

Sábado, 7. O Sr. Oglethorpe regressou de Savannah com o Sr. Spangenberg, um dos pastores dos alemães. Eu logo descobri de que espírito ele era, e pedi seu conselho em relação à minha própria conduta. Ele disse, “Meu irmão, primeiro devo fazer uma ou duas perguntas. Você tem o testemunho dentro de si mesmo? O Espírito de Deus testemunha com seu espírito de que você é um filho de Deus?” Fui surpreendido e não sabia o que responder. Ele percebeu e perguntou, “Você conhece Jesus Cristo?” Hesitei e disse, “Sei que ele é o Salvador do mundo.” “Certo,” ele respondeu, “mas sabe também que ele salvou você?” Respondi, “Creio que ele morreu para me salvar.” Ele somente acrescentou, “Você mesmo o sabe?” Disse, “Sim.” Mas receio que foram palavras vãs.

Segunda-feira, 9. Eu lhe fiz muitas perguntas, tanto a respeito de si mesmo quanto da igreja em Hernhuth. A essência de suas respostas foi esta:

“Aos dezoito anos de idade, fui enviado à universidade de Jena, onde passei alguns anos no aprendizado de línguas e da vã filosofia, o que, agora, há muito venho me esforçando para esquecer. Aqui aprouve a Deus, por meio de alguns que pregaram sua palavra com poder, mudar meu coração. Eu imediatamente lancei fora todo meu estudo, exceto o que visava salvar a minha alma. Me afastei de toda companhia, e me retirei para um local solitário, decidindo passar minha vida lá. Por três dias eu tive muito consolo aqui, mas no quarto tudo foi embora. Fiquei surpreso e fui a um cristão experiente em busca de conselhos. Quando cheguei a ele, eu não conseguia falar. Mas ele viu meu coração, e me aconselhou a voltar para minha casa, e seguir a carreira à qual a Providência me chamou. Voltei, mas não estava preparado para nada. Eu não conseguia fazer negócios nem participar de uma conversa. Tudo que conseguia dizer a alguém era Sim ou Não. Muitas vezes não conseguia dizer isso, nem entender a coisa mais clara que me dissessem. Meus amigos e conhecidos me consideravam uma pessoa morta, não vinham falar comigo, nem falavam a meu respeito.

“Quando melhorei, comecei a instruir algumas crianças pobres. Com a união de outros, ensinávamos cada vez mais, até que havia mais de trinta professores, e mais de duzentos alunos. Tinha agora convites para outras universidades. Mas não consegui aceitar nenhuma. Desejava apenas, se fosse a vontade de Deus, ser pequeno e desconhecido. Tinha passado alguns anos dessa forma, quando o Professor Brethaupt, de Halle, morreu: sendo então pressionado a me mudar para lá, pensei que era chamado de Deus e fui. Não tinha ficado muito tempo lá, antes de muitas falhas em meu comportamento e pregação serem descobertas; e ofensas cresciam cada vez mais, até que, após seis meses, uma petição contra mim foi enviada ao Rei da Prússia, que transmitiu ordem ao líder em Halle; em conseqüência disso, fui notificado a deixar a cidade em quarenta e oito horas. Assim fiz, e me retirei para Hernhuth para o Conde Zinzendorf.

“A vila de Hernhuth contém cerca de mil almas, reunidas de muitas nações. Elas se mantêm fiéis à disciplina, assim como à fé e prática da igreja apostólica. Os irmãos quiseram que eu fosse para lá ano passado, para conduzir dezesseis deles a Geórgia, onde dois lotes de terra foram transferidos a nós; e com eles tenho ficado até então.”

Eu perguntei, “Para onde ele devia ir em seguida?” Ele disse, “Penso em ir para a Pensilvânia. Mas o que Deus fará comigo, não sei. Sou cego. Sou uma criança. Meu Pai sabe; e estou preparado para ir aonde quer que ele me chame.

Sexta-feira, 13. Alguns dos índios nos informaram de sua intenção de descer até nós. Durante nossa leitura hoje, foram ditas estas palavras: “Assim diz o SENHOR dos Exércitos: Ainda sucederá que virão os povos e os habitantes de muitas cidades. E os habitantes de uma cidade irão à outra, dizendo: Vamos depressa suplicar o favor do SENHOR, e buscar o SENHOR dos Exércitos; eu também irei. Assim virão muitos povos e poderosas nações, a buscar em Jerusalém ao SENHOR dos Exércitos, e a suplicar o favor do SENHOR,” Zc 8.20-22.

Sábado, 14. Por volta da uma, Tomo Chachi, seu sobrinho Thleeanouhee, sua esposa Sinauky, com mais duas mulheres, e duas ou três crianças índias, embarcaram. Tão logo entraram, todos eles se levantaram e nos sacudiram pela mão, e Tomo Chachi (uma certa Sra. Musgrove traduziu) falou assim:

“Fico feliz que vieram. Quando estava na Inglaterra, desejei que alguns me falassem da grande Palavra, e então minha nação desejou escutá-la, mas agora todos estamos confusos. Contudo, fico feliz que vieram. Eu subirei e falarei aos homens sábios de nossa nação, e espero que eles ouçam. Mas não queremos nos tornar cristãos tal como os espanhóis fizeram cristãos: queremos ser ensinados antes que possamos ser batizados.”

Respondi, “Há somente Um, Aquele que está assentado no céu, que é capaz de ensinar sabedoria ao homem. Embora viemos até aqui, não sabemos se será da vontade dele ensinar vocês através de nós ou não. Se ele ensinar vocês, irão aprender sabedoria, mas não podemos fazer nada.” Então nos retiramos.

Segunda-feira, 16. O Sr. Oglethorpe partiu para a nova colônia junto ao rio Alatamahaw. Levou consigo cinqüenta homens, além do Sr. Ingham, o Sr. Hermsdorf, e os três índios.

Quinta-feira, 19. Meu irmão e eu nos colocamos ao mar e, passando por Savannah, fomos fazer nossa primeira visita na América aos pobres pagãos. Mas nem Tomo Chachi nem Sinauky estava em casa. Retornando, fomos ver o Sr. Causton, o chefe magistrado de Savannah. Daí fomos com o Sr. Spangenberg aos irmãos alemães. Por volta das onze retornamos ao barco, e chegamos ao nosso navio às quatro da manhã aproximadamente.

Sábado, 21. Mary Welch, com 11 dias de idade, foi batizada conforme o costume da Igreja primitiva, e o preceito da Igreja da Inglaterra, por imersão. Nessa ocasião, a criança estava doente, mas se recuperou desde então.

Terça-feira, 24. O Sr. Oglethorpe voltou. No dia seguinte, me despedi da maioria dos passageiros do navio, que se mostraram todos sérios. Pode ser que nem toda semente tenha caído em pedregais.

À noite fui para Savannah novamente, de onde o Sr. Spangenberg, o Bispo Nitschman e Andrew Dober subiram conosco à casa da Sra. Musgrove, para escolher um local para a pequena casa que o Sr. Oglethorpe prometeu construir para nós. Estando, mais tarde, insatisfeitos com o nosso barco, fomos obrigados a passar a noite lá. Mas onde quer que estejamos, é a mesma coisa, sendo a vontade de nosso Pai que está nos céus.

No dia seguinte, no nosso retorno (estando então o Sr. Quincy na casa na qual estivemos depois), o Sr. Delamotte e eu nos alojamos com os alemães. Tínhamos agora oportunidade, dia a dia, de observar todo o seu comportamento. Pois estivemos em um quarto com eles de manhã até a noite, exceto o pouco tempo que passei caminhando. Eles sempre se dedicavam, invariavelmente animados e de bom humor, uns aos outros; eles tinham colocado de lado todo ódio, discórdia, ira, mágoa, queixa e maledicência; eles andavam como é digno da vocação com que foram chamados, e embelezavam o Evangelho de nosso Senhor em todas as coisas.

Sábado, 28. Eles se reuniram para conversar sobre os assuntos de sua Igreja: devendo em pouco tempo o Sr. Spangenberg ir para a Pensilvânia e o Bispo Nitschman retornar para a Alemanha. Após várias horas de conferência e oração, eles prosseguiram para a eleição e ordenação de um Bispo. A notável simplicidade, assim como a solenidade de tudo, quase me fez esquecer o tempo de mil e setecentos anos que nos separa, e me imaginar em uma daquelas assembléias, onde não existiam formalidade nem grandeza, mas Paulo o fabricante de tendas, ou Pedro o pescador, presidia, todavia com a demonstração do Espírito e de poder.

Domingo, 29. Ficando sabendo que o Sr. Oglethorpe não vinha mais para Savannah, antes que ele fosse para Frederica, fui obrigado a descer ao navio novamente (me seguindo para lá o Sr. Spangenberg), e receber suas ordens e instruções sobre vários assuntos. Dele fomos às orações públicas, depois das quais fomos revigorados pelas várias cartas da Inglaterra. Sobre as quais eu não pude senão perceber, quão cuidadoso nosso Senhor é, nos retribuindo tudo que abandonamos por sua causa. Quando deixei a Inglaterra, temia sobretudo duas coisas: a primeira, que eu nunca mais tivesse tantos fiéis amigos como os que lá deixei; a outra, que a centelha de amor que começou a inflamar em seus corações esfriasse e se extinguisse. Mas quem conhece a misericórdia e o poder de Deus? De dez amigos estou separado há algum tempo, e ele me abriu uma porta de uma Igreja inteira. E quanto às mesmas pessoas que deixei para trás, seu Espírito tem se revelado ainda mais, ensinando-os a não confiar no homem, mas naquele que “vivifica os mortos, e chama as coisas que não são como se já fossem.” Pelas quatro, tendo me despedido do Sr. Spangenberg, que na próxima manhã devia partir para a Pensilvânia, voltei para Savannah.

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Conferir: www.tybeevisit.com

Tradução: Paulo Cesar Antunes

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